Tecnologia Mbbr
Por Carla Legner
Edição Nº 50 - agosto/setembro de 2019 - Ano 9
Atualmente, o mercado oferece diversas tecnologias para o tratamento de água, como o processo MBBR. A tecnologia de sistema de tratamento de esgoto do tipo Moving Bed Biofilm Reactors (Reatores Biológicos com leito Móvel) foi desenvolvida na Noruega
Atualmente, o mercado oferece diversas tecnologias para o tratamento de água, como o processo MBBR. A tecnologia de sistema de tratamento de esgoto do tipo Moving Bed Biofilm Reactors (Reatores Biológicos com leito Móvel) foi desenvolvida na Noruega na década de 1980, através da parceria firmada entre a companhia Kaldnes Milj?teknologi AS (KMT), especialista em tratamento de efluentes doméstico e industrial, e o Instituto de Pesquisa SINTEF.
Trata-se basicamente de uma tecnologia adaptada ao sistema de lodos ativados, por meio da introdução de pequenas peças de plástico de baixa densidade e de grande área superficial (biomídias) no interior tanque de aeração que atuam como meio suporte para desenvolvimento do biofilme, mantidos em constante circulação e mistura, seja em função da introdução de ar difuso ou devido à existência de agitadores mecanizados, não havendo a necessidade de recircular o lodo.
"É um avanço tecnológico do processo de lodos ativados, combinado a biomassa suspensa do processo com a biomassa fixada em um suporte plástico flutuante que é inserida no reator com o objetivo de melhorar a desempenho do processo, quanto ao nível de tratamento, para remoção de carga orgânica e nutrientes com significativa
redução de área para implantação da ETE – Estação de Tratamento de Efluente, com robusto e efetivo ganho, na estabilidade do processo"- completa Rosvaldo Catino, representante da Enviromex.
O sistema de lodos ativados é um processo biológico aeróbio (que requer oxigênio) e consiste na degradação da matéria orgânica presente nos esgotos pela ação metabólica de microrganismos. Os processos de tratamento biológico aeróbio são os mais empregados em virtude da elevada qualidade do efluente produzido, do reduzido requisito de área e a larga experiência adquirida ao longo de anos de aplicação deste processo.
Trata-se um sistema contínuo, onde as condições naturais existentes em rios e lagos são adaptadas para um tanque onde os fatores limitantes são supridos de forma controlada. As águas residuárias após tratamento preliminar vão ao tanque de aeração, onde uma massa de microrganismos é responsável pela degradação da matéria orgânica complexa, presente nesse despejo.
Os sistemas MBBR são normalmente utilizados em tratamento de esgotos e efluentes industriais para obtenção de efluentes de maior remoção de carga orgânica e nutrientes; ETE’s para municípios sujeitos à grande variações de carga hidráulica; upgrade de estações existentes com baixa eficiência, que necessitem receber mais cargas orgânicas e /ou que operem em situações de sobrecarga; ETE’s que visem tratar efluentes sujeitos a choques de carga orgânica; e Projetos de ETE’s sujeitos ao recebimento de substâncias tóxicas (Metais Pesados, Fenois, Cianetos, etc).
O processo e como funciona
De acordo com Catino, o mecanismo de depuração desse sistema depende da atividade metabólica dos microrganismos que utilizam o resíduo orgânico como substrato, durante a respiração aeróbia, como material para síntese celular. Como resultado, a matéria orgânica composta em sua maioria por carbono e nitrogênio é oxidada a compostos sem valor energético, tais como gás carbônico, água, nitratos. Neste processo a biomassa celular é formada e constitui o lodo que através do sistema de recirculação é ativado, tornando-se especialista na degradação de determinadas substâncias que compõem o efluente a ser tratado.
As mídias MBBR (biomídias), ou carriers são anéis plásticos com densidade em torno de 0,96 g/ml que, inseridas no reator (tanque de aeração), flutuam e servem de suporte para a formação de um biofilme composto por microrganismos decompositores. O princípio de funcionamento do processo MBBR é o mesmo de decomposição aplicado ao processo de lodos ativados, onde microrganismos aeróbios/facultativos, formadores do lodo biológico, são mantidos no reator para decomposição da matéria orgânica contida nos efluentes sanitários ou industriais.
"A grande diferença é a maior concentração de sólidos (microrganismos) por m³ de reator biológico e a composição do lodo, que no caso do MBBR é híbrido, composto em parte por lodo floculento e em suspensão (lodo ativado) e em parte por lodo fixado na superfície da mídia" - destaca o representante da Enviromex.
O lodo formador do biofilme é composto por microrganismos decompositores que possuem características adversas e por estarem fixados na superfície, disponibilizada pelo suporte, não saem continuamente do reator, oferecendo ao processo um lodo mais estável, mais aclimatado às condições do efluente e, principalmente, mais resistente às condições de choques de carga orgânica e hidráulica, choques químicos e choques tóxicos a que estão sujeitos os esgotos sanitários e efluentes industriais.
Biomídias
Fábio Campos, Biólogo com Mestrado em Engenharia Sanitária e especialista em processos MBBR, explica que comercialmente encontram-se disponíveis no mercado, biomídias com densidade específica entre 0,94 e 0,96 g.cm-³, com área superficial específica variando de 450 a 1200 m2.m-³, permitindo, quando em termos de equivalência com a concentração de sólidos em suspensão presentes no tanque. As Biomídias divergem na sua maioria pela disponibilização de área protegida para criação do biofilme, e/ ou pelo material empregado na sua fabricação.
Com relação à área disponibilizada, quanto maior a área, maior a quantidade de lodo a ser formado e menor a quantidade de biomídia a ser aplicada por volume de reator. A área protegida deve ser calculada pela área superficial interna da biomídia, multiplicada pelo número de peças por metro cúbico. A superfície externa fica exposta ao choque com outras biomídias dificultando a formação do biofilme, por isso não deve ser considerada como área útil na modalidade MBBR.
O número de peças deve ser calculado pelo arranjo perfeito, quantificando o número de peças posicionadas ao lado da outra e uma sobre a outra em um recipiente de 1 m³ (1m x 1m x 1m).
O arranjo aleatório é obtido pelo cálculo da porcentagem que encheria o mesmo recipiente, porém de forma desordenada. A porcentagem deve ser obtida por amostragem e contagem em recipientes menores, a exemplo 50 a 250 litros. Esta porcentagem varia entre 78% a 85% dependendo do tamanho da biomídia. Quanto menores as dimensões, maior a porcentagem em relação ao arranjo perfeito.
Por sua vez, a seleção da biomídia em função da área protegida a ser utilizada depende da carga orgânica do efluente, dos volumes de tanques existentes, ou a serem executados, da qualidade do efluente desejada e do tempo de detenção hidráulico do reator. É importante observar que o enchimento dos tanques, com biomídias MBBR, variam entre um mínimo de 30% e um máximo de 70% e isso pode limitar a área da biomídia a ser utilizada.
"Uma biomídia com muita área, por exemplo 1000 m2/m³, ou superior, para o enchimento de 30 % do volume do tanque, considerado mínimo, necessita um tanque de aeração de volume muito reduzido, é necessário considerar o tempo de detenção hidráulico do efluente (TDH) que não deve ser inferior a um determinado valor, pois o tempo de contato entre o efluente a tratar e os microrganismos seria insuficiente para os processos metabólicos envolvidos", explica Catino.
Ele ressalta também que deve ser dada uma atenção especial a geometria da peça, uma vez que, biomídias que possuem maiores áreas, em grande parte, apresentam aberturas muito restritas e de pequenas dimensões, não permite o fluxo do substrato e consequentemente a formação de um biofilme saudável. Várias mídias do mercado, que oferecem grandes áreas, não possuem as áreas interiores disponibilizadas, pois o biofilme superficial, bloqueia o fluxo do líquido para as camadas inferiores.
Quanto ao material de fabricação, existem no mercado Biomídias fabricadas em PP (Polipropileno) e PEAD (Polietileno de Alta Densidade), ambos compatíveis com a tecnologia MBBR. São estes os mais utilizados, e uma vez, sendo confeccionados em matéria prima 100 % virgem, apresentam vida superior há 20 anos.
Vale destacar que alguns fabricantes de MBBR optam por uma matéria prima reciclada, na cor preta e de baixíssima qualidade, comprometendo, em muito, a qualidade do processo, interferindo na imagem da tecnologia do MBBR. "Acreditamos que o mercado de tratamento de efluentes, cada vez mais competitivo, tem observado esta questão com muita propriedade" – enfatiza Catino.
Campos explica ainda que de uma forma geral, as biomídias presentes no sistema MBBR contribuem basicamente para manter elevada concentração de biomassa ativa, resultante do controle da espessura do biofilme em decorrência dos choques e cisalhamentos provocados pela energia da mistura; para a habilidade de reter biomassa altamente especializada para cada tipo de condição imposta ao reator, independente do parâmetro idade do lodo; e para permitir a capacidade de se ajustar a altas taxas de difusão, resultantes das condições de turbulência impostas ao reator.
É justamente no interior das biomídias que se desenvolve o biofilme, parte atuante no processo de tratamento. Trata-se de pequenos ecossistemas geralmente constituídos de três camadas. De acordo com Campos na primeira camada de colonização, as macromoléculas presentes no esgoto são adsorvidas promovendo clarificação, uma vez que são transportadas para a o interior da biomídia; na segunda camada, observam-se os processos aeróbios de estabilização da matéria orgânica com máxima taxa de crescimento dos microrganismos envolvidos.
Ele destaca que se observa também a produção de exopolímeros que promovem a estabilidade e aderência ao biofilme. Na terceira camada, devido à indisponibilidade de OD, ocorrem processos anaeróbios/anóxicos, além de possível respiração endógena em função da baixa quantidade de substrato.
Vantagem e desvantagens
O sistema MBBR incorpora as características dos processos de crescimento de biomassa em suspensão e aderida, conferindo ao processo um aporte considerável de microrganismos atuantes na depuração do esgoto, permitindo assim, tratar cargas orgânicas carbonáceas e nitrogenadas mais elevadas quando comparado ao sistema de lodos ativados convencional. Campos destaca as principais vantagens do seu uso:
• Menor volume dos reatores biológicos, se comparado com o sistema de lodo ativado conjugado com clarificadores para alcançar os mesmos objetivos de tratamento;
• As taxas de aplicação de sólidos para as unidades de clarificação são significantemente reduzidas quando comparadas às de sistemas de lodo ativado;
• Não há necessidade de operações de retrolavagem para controle da espessura de biofilme ou desentupimento do meio suporte, por se tratar de reatores de mistura completa e fluxo contínuo;
• Ao contrário do sistema de lodos ativados, não depende da etapa de separação de sólidos para manter a densidade populacional de microrganismos, uma vez que a maior parte da biomassa ativa é retida continuamente no reator;
• Sua versatilidade permite considerar viável uma grande variedade de formas geométricas para o reator;
• Maior capacidade para absorver cargas de choque;
• Ocorrência de desnitrificação em zonas anaeróbias nas camadas profundas do biofilme;
• Facilidade para oxidar cargas com altas taxas de componentes solúveis dentro do biofilme;
• Possibilidade de trabalhar com baixa idade do lodo, gerando uma menor produção de lodo;
• Maior eficiência da nitrificação independentemente da idade do lodo.
"Um ponto a ser considerado em contraste com as inúmeras vantagens dessa tecnologia é o consumo de oxigênio. A necessidade de manter viáveis tanto a biomassa aderida quanto a biomassa em suspensão deve requerer uma maior quantidade de oxigênio dissolvido (OD)", completa Campos.
A camada líquida à superfície do biofilme formado nos corpos móveis é limitante para a transferência de oxigênio. Como o oxigênio dissolvido é consumido para degradação de matéria orgânica por microrganismos heterotróficos, que se posicionam na parte externa do biofilme, para obtenção da nitrificação o nível de oxigênio dissolvido deve ser elevado para que haja penetração nas camadas internas, região em que predominam as bactérias nitrificantes.
Normalmente, um sistema MBBR pode ser composto por vários reatores em série ou em paralelo, dependendo da aplicação. O volume do reator é totalmente misturado e consequentemente não devem existir as "zonas mortas". Não há necessidade de recirculação, tão pouco retorno de biomassa para o tanque de aeração, e a capacidade do reator pode ser alterada pela simples mudança no grau de enchimento.
"O MBBR é um processo bastante compacto que garante melhor qualidade do efluente tratado quanto à remoção de carga orgânica e nutrientes. É um processo que absorve bem os choques hidráulicos decorrentes de vazões de pico (chuvas) e choques de carga decorrentes de descargas atípicas e acidentes produtivos sem desestabilização prolongada do processo", explica Catino.
Para ele, uma das principais vantagens é a aplicação das biomídias em sistemas existentes para a melhora de processos onde o sistema está sobrecarregado ou sofre deturpações devido às variações de cargas orgânicas ou cargas tóxicas, sem a necessidade de parar a planta. É um processo que pode ocupar 3 a 5 vezes menos área que um processo de lodos ativados e garantir melhor operacionalidade em função da estabilidade do lodo biofixado.
O sistema MBBR pode utilizar, preferencialmente, o sistema de difusor de bolhas grossas. Isso agrega uma grande vantagem ao processo, pois as peças em suspensão no meio líquido promovem a quebra das bolhas em bolhas menores e também retardam o tempo de subida das bolhas, aumentando o tempo de detenção e troca gasosa.
Isso por si só já diminui a vantagem da aplicação do sistema de bolhas finas para a aeração do processo de lodos ativados, mas a grande vantagem associada ao sistema de bolhas grossas é que se utilizado um sistema bem dimensionado, com o emprego de materiais adequados, o mesmo nunca necessitará ser substituído, em quanto o sistema de aeração por bolhas finas, necessita de substituição periódica do diafragma de borracha.
Catino destaca que outra vantagem muito importante é a redução da produção de lodo em excesso, principal subproduto de uma estação de tratamento de esgotos, variando entre 25% e 50%, dependendo da modalidade do processo de lodos ativados. Isso significa redução significativa de custos para a disposição final dos lodos descartados.
"O mercado de saneamento, bem como o mercado industrial, ainda sofre com a recessão econômica que atravessa o país, porém existe a expectativa de melhoras no setor e hoje, a cada dia mais, as empresas de saneamento buscam as inovações tecnológicas para agregar maior eficiência aos processos de tratamento de esgotos e efluentes, sejam para ETE’s compactas ou ETE’s de grande porte. Neste segmento o MBBR tem se destacado tanto pela confiança adquirida ao longo de mais de 20 anos de aplicação, como a durabilidade dos equipamentos e da biomídia em especial", completa o representante da Enviromex.
Contato:
Enviromex: www.enviromex.com.br
Fábio Campos: fcampos@usp.br