Demanda Por Reaproveitamento De Águas Cinzas Cresce Nos Últimos Dois Anos
Por Cristiane Rubim
Edição Nº 43 - junho/julho de 2018 - Ano 8
Hoje construções civis prediais e unifamiliares, empreendimentos comerciais e residenciais, shopping centers, metalúrgicas e siderúrgicas, entre outros, fazem reaproveitamento de águas cinzas
Hoje construções civis prediais e unifamiliares, empreendimentos comerciais e residenciais, shopping centers, metalúrgicas e siderúrgicas, entre outros, fazem reaproveitamento de águas cinzas. O mercado de construção civil, principalmente o corporativo, mostra um grande potencial a ser explorado. E as empresas têm interesse também sim. Ainda não há legislação adequada para o assunto e faltam incentivos fiscais que promovam a instalação de sistemas compactos de tratamento em empreendimentos.
"Mas para toda e qualquer implementação de novas tecnologias ainda há uma certa dificuldade de conscientização. Mesmo assim, nos últimos dois anos, observamos um aumento expressivo de demanda" - aponta Carlos Eduardo A. Teixeira, diretor da Acquanova. É importante entender, segundo Teixeira, que o reaproveitamento de água cinza para fins não potáveis compensa a dificuldade de atendimento da demanda, reservando a água de melhor qualidade para usos mais nobres, como o abastecimento doméstico. Existem novas tecnologias, mas com o custo extremamente alto. "A nossa tecnologia foi implantada em 2012 e possibilita alta eficiência com um custo e pay-back bem plausíveis" - diz. As águas para reaproveitamento são classificadas de acordo com a NBR 13.969/97. Mas ainda não houve mudanças, as alterações de classificação e destino estão em estudo.
Matriz hídrica
"A água cinza é uma fração do esgoto doméstico que não conta com os efluentes de cozinha e de sanitários. Trata-se de um efluente com menor carga orgânica e uma contaminação potencialmente mais baixa do que o esgoto bruto" - explica a engenheira Sibylle Muller, CEO e fundadora da AcquaBrasilis. Ela diz que o tratamento convencional biológico, por lodos ativados, usado em esgotos domésticos, não funciona muito bem para o tratamento de águas cinzas devido às águas cinzas terem teores mais baixos de carga orgânica, o que compromete sua eficiência de tratamento.
Para compor a matriz hídrica, as águas de chuvas, as águas subsuperficiais e as águas de condensação de sistemas de ar condicionado também podem ser tratadas para aproveitamento, fazendo o melhor uso das águas em um empreendimento.
Não temos no Brasil ainda legislação adequada para o assunto. Para isso, Sibylle cita o Relatório Mundial das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento dos Recursos Hídricos 2017, lançado em 2017 pela Unesco, que diz que "é necessário modificar a gestão dessas águas residuais e "passar de um modelo de ‘tratamento e eliminação’ para um modelo de ‘redução, reutilização, reciclagem e recuperação dos recursos".
No exterior, não há, também, unanimidade quanto aos padrões de reúso. "Há países, como a Alemanha, que são mais restritivos e outros, como os Estados Unidos, que são menos exigentes quanto à qualidade final da água de reúso, tendo seus parâmetros admissíveis variações de Estado para Estado daquele país" - conta Sibylle. O certo é que a qualidade final da água de reúso deve estar de acordo com o tipo de consumo da água tratada, sempre tendo em vista a preservação da saúde pública e do grau de contato humano em cada caso.
Outra questão é que hoje, tecnicamente, é possível tratar praticamente todas as águas para deixá-las potáveis. Mas, em princípio, falamos em águas potáveis e não potáveis. "Águas de reúso, em geral, não são usadas para fins potáveis pelo alto custo do processo de tratamento, que ainda não se justifica diante das reservas de águas potáveis disponíveis" - ressalta Sibylle. No Brasil, conforme diz, a água potável deve atender à Portaria nº 2.914, do Ministério da Saúde, que exige diversos parâmetros de qualidade da água e diversos controles, resultando num alto grau de responsabilidade e comprometimento de quem se dispõe a fornecer água potável.
Expertise
Pioneira em tratamento de águas cinzas, a AcquaBrasilis trouxe, em 2001, para o mercado brasileiro um sistema de tratamento de águas por contatores (rotores) biológicos, com tecnologia alemã, que permitia em empreendimentos comerciais e residenciais que a água residual fosse tratada próxima aos pontos de consumo e devolvida para um novo uso no mesmo empreendimento.
Com sua tecnologia, e em parceria com os projetistas hidráulicos, foi possível realizar projetos com tubulações separadas, de captação da água cinza e de alimentação de água não potável tratada em fins não potáveis, como vasos sanitários, torneiras de jardim, torres de resfriamento para ar condicionado, entre outros.
Os números comprovam o expertise da AcquaBrasilis. A empresa já elaborou 189 projetos para sistemas de tratamento de água cinza para reúso. Efetivamente já forneceu, até maio de 2018, 111 ETACs – Estações de Tratamento de Água Cinza para empreendimentos comerciais, residenciais e shopping centers. Neste mercado, a capacidade instalada pela AcquaBrasilis é de aproximadamente 52.290 m3 por mês de água de reúso advinda do tratamento de águas cinzas.
Entre os empreendimentos atendidos, no Centro-Oeste, foram instalados sistemas de reúso de águas cinzas na Confederação Nacional do Comércio, em Brasília; em empreendimentos residenciais da MB-Brookfield, em Águas Claras; e em vários edifícios residenciais, em Goiânia. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, há dezenas de sistemas instalados em empreendimentos comerciais modernos e de alto padrão e em edifícios residenciais, já projetados com o conceito de reúso. Em Londrina, há um sistema instalado que fornece 120 m3/d de água de reúso para um shopping center.
De 2001 até 2010, a AcquaBrasilis instalou 10 sistemas de reúso de água cinza, com capacidade instalada de 130 m3/d. Em 2014, já tinha fornecido 55 sistemas de tratamento de água cinza para reúso, com capacidade instalada de 1.310 m3/d. Atualmente, com capacidade instalada estimada em 1.843 m3/d, poderia abastecer, com água de reúso para descargas de vasos sanitários, uma população de 73.700 habitantes ou irrigar diariamente uma área de 921.500 m2.
Segundo Sibylle, como as tecnologias usadas no mercado, caso dos sistemas físico-químicos, apesar do custo inicial mais baixo, demandam mais produtos químicos e operação adequada, a AcquaBrasilis optou pelo sistema de tratamento biológico por rotores. Este sistema permite a degradação da matéria orgânica conforme o necessário, reduzindo a carga orgânica do efluente, com baixo custo energético, automático e sem lodos químicos a serem dispostos. Com boa eficiência, o sistema é silencioso, com baixo consumo de energia elétrica e se adapta bem à baixa carga orgânica da água cinza.
O princípio é baseado na formação do biofilme, uma estrutura que se forma, sobre superfícies de contato, a partir da aderência à matéria orgânica e bactérias que a digerem. Os rotores ficam semissubmersos e dotados de uma estrutura interna em forma de favos de colmeias de abelhas, com alta superfície de contato. À medida que os rotores giram dentro do meio aquoso, o biofilme vai se formando e sendo exposto, ora ao oxigênio do ar, ora ao líquido de onde vêm as bactérias e a carga orgânica a ser depurada.
Retorno do investimento
Com o custo crescente da água, principalmente para fins comerciais e industriais, recursos ligados a tecnologias da informação permitem que o reúso de águas cinzas seja altamente vantajoso em termos financeiros e ambientais. "Os sistemas da AcquaBrasilis são versáteis e automatizados e podem ser acoplados a outros sistemas de automação do empreendimento" - salienta Sibylle.
Os sistemas da AcquaBrasilis têm apresentado um período de retorno dos investimentos que vai de 1 a 2 anos. "É importante também fazer uma supervisão constante da manutenção e operação do sistema para a garantia contínua da qualidade da água e dos baixos custos de manutenção" - ressalta Sibylle.
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Aposta no mercado corporativo
Hoje não é mais o foco de atuação, mas, há alguns anos, a Acquasys foi uma das pioneiras na importação de equipamentos compactos para tratamento de águas cinzas, usando tecnologia alemã com membranas cerâmicas para obtenção de água de reúso de alta qualidade. "Naquela época, fizemos trabalho prospectivo com incorporadoras, construtoras, projetistas e instaladoras, quando ainda havia pouco conhecimento do mercado a respeito", conta Allan Sarev - diretor da Acquasys.
Na opinião de Sarev, o mercado da construção civil, principalmente o corporativo, tem grande potencial para o tratamento e reúso de águas cinzas. Para ele, isso pode acontecer desde que seja contemplado pela incorporadora/construtora um empreendimento sustentável ou empreendimentos antigos que visem "retrofit".
Sarev explica que, quando uma incorporadora/construtora pretende lançar um empreendimento sustentável, é contratada uma consultoria certificadora, como GBC Brasil – Green Building Council Brasil, Fundação Vanzolini, entre outras. "Existem diversos tipos de certificações que um empreendimento pode conquistar, dependendo do investimento que o empreendedor busca obter" - diz.
O investimento que um empreendedor for fazer indica o grau de sustentabilidade de um novo empreendimento. Este investimento pode ser mais baixo com obtenção de uma certificação mínima ou mais alto com certificação máxima. Segundo Sarev, no caso específico de águas de reúso, o projeto de um novo empreendimento ou de um retrofit deve contemplar o uso de prumadas específicas de águas servidas, por exemplo, águas cinzas – captadas de lavabos, copas, chuveiros etc., que são encaminhadas a um reservatório próprio, normalmente, no subsolo de garagens. Estas águas serão tratadas localmente, visando ao reúso.
Estas águas de reúso também precisam ser bombeadas através de prumadas próprias de águas de reúso, perfeitamente identificadas, até os reservatórios superiores, por exemplo, de um prédio corporativo, e de lá são distribuídas por tubulações de águas de reúso aos pontos de consumo: bacias sanitárias – vasos e mictórios, limpeza de pisos de áreas comuns ou para fins de rega de jardins, entre outros.
O mesmo raciocínio se aplica às prumadas, quando o empreendimento busca tratar também águas pluviais ou águas negras no local, visando ao reúso. "Quanto maior o nível de reúso de água que pretenda se obter, tanto em um empreendimento corporativo quanto em um residencial, maior será o investimento inicial em termos de projeto hidráulico, reservatórios etc." - ressalta Sarev. No residencial, de acordo com ele, é mais complexo ainda, quanto aos riscos de saúde envolvidos no uso indevido que pode haver da água de reúso. Fazer o balanço econômico e retorno financeiro é indispensável para a tomada de decisões por parte do empreendedor e uso final do empreendimento.
Indústrias interessadas sim
A questão é que muitos empreendedores buscam equipamentos com baixo custo e não qualidade da água que será tratada, visando ao reúso. "Este mercado é extremamente pulverizado e não basta somente a venda de um equipamento de tratamento de águas cinzas. É necessário todo um plano de manutenção do equipamento, com a contratação de empresas especializadas, que não necessariamente são as que vendem o equipamento, que fazem análises da água tratada, fornecimento de insumos químicos e manutenção do equipamento" - aponta Sarev. Além disso, segundo ele, muitos empreendimentos visam um sinergismo de tratamento de águas cinzas e águas pluviais, respeitando a sazonalidade; espaço físico, pequeno e caro nas grandes cidades; entre outros.
Existem no mercado diversas tecnologias para tratamento de águas cinzas. Sarev especifica: "Tratamento físico-químico convencional, barato, mas não ecologicamente sustentável; tratamento biológico, de eficiência questionável em face da baixa carga orgânica na água cinza; e tratamento com membranas de ultrafiltração, alta tecnologia, excelente qualidade de água de reúso" - diz.
Assim como Sibylle e outros profissionais do setor, ele também chama a atenção para a falta de regulamentação do setor. "Não há ainda uma regulamentação efetiva dos órgãos ambientais federais, estaduais e municipais quanto à qualidade da água de reúso. Existem algumas normativas internacionais e algumas cidades brasileiras com medidas pontuais" - adverte.
Faltam ainda incentivos fiscais que promovam a instalação de sistemas compactos de tratamento em empreendimentos, visando ao reúso da água. "A água cinza tratada no local do empreendimento gera menos esgoto enviado para a rede pública, nos locais onde ela existe, e menos receita para as companhias de saneamento. Isso também explica em parte a falta de regulamentação por órgãos públicos quanto à qualidade da água de reúso, pois haveria uma certa concorrência" - analisa.
Para Sarev, as indústrias têm interesse, sim, no tratamento de águas cinzas e pluviais, visando ao seu reúso, principalmente as que têm uso intensivo de mão de obra. "Isso porque o retorno no investimento é muito rápido, além de terem espaço físico e estarem situadas em regiões menos densamente povoadas" - avalia.
Contato das empresas
AcquaBrasilis: www.acquabrasilis.com.br
Acquanova: www.acquanova.com.br
Acquasys: www.acquasystems.com.br
Aquapolo: www.aquapolo.com.br