Processos oxidativos avançados

Basicamente nas reações de oxi-redução, também conhecidas como reações de oxidação-redução ou simplesmente reações redox, há uma transferência de elétrons entre íons simples, agrupamento iônico ou substâncias moleculares, sólidas e gasosas.


Processos oxidativos avançadosReações de oxi-redução: balanceamento de equações e número de oxidação
Basicamente nas reações de oxi-redução, também conhecidas como reações de oxidação-redução ou simplesmente reações redox, há uma transferência de elétrons entre íons simples, agrupamento iônico ou substâncias moleculares, sólidas e gasosas. O agente que recebe os elétrons é conhecido como oxidante, enquanto que aquele que perde o elétron é o redutor.
Cada átomo no estado natural possui um número definido de elétrons, caso ele perca elétrons o seu número de oxidação é aumentado e fica mais oxidado. Por exemplo, o ferro metálico possui o número de oxidação zero, assim especificado Fe°, isso quer dizer que o elemento não perdeu e não ganhou nenhum elétron, no entanto, o seu estado mais comum na natureza é na forma de óxido, sendo que nessa condição normalmente ele se encontra na forma oxidada de Fe3+, ou seja, os átomos de oxigênio, bastante eletronegativos, presentes na molécula atraem os três elétrons do átomo de ferro, formando a conhecida ferrugem.
É de fundamental importância em trabalhos envolvendo reações químicas que se determine a proporção entre os vários reagentes utilizados, bem como dos produtos obtidos. Por exemplo, para que uma reação de oxidação seja completa, é importante que a quantidade do agente oxidante seja muito bem estipulada, para que a reação seja completa, e mesmo que não reste no reator, aumentando os custos e possível toxicidade do efluente. Considerando o número de elétrons que cada um dos reagentes ganham ou perdem é possível prever com grande segurança a proporção entre eles. Isso é conhecido como balanceamento de uma equação química.

Especiação química
A especiação química está relacionada diretamente com a descrição das diferentes espécies ou formas em que um composto ou elemento está presente num determinado sistema. Por exemplo, várias espécies metálicas presentes num meio aquáticos podem estar na forma de um metal "livre" hidratado, complexos inorgânicos e/ou orgânicos, também ligados a partículas sólidas de diferentes dimensões, na forma coloidal ou mesmo adsorvida (ou absorvida) por micro-organismos. Também as espécies são bastante diferenciadas em relação ao seu número de oxidação.
Por exemplo, as formas do elemento cromo mais comuns na natureza são Cr3+ e Cr6+, sendo o último mais oxidado e muito mais tóxico que o primeiro. A especiação está diretamente relacionada com a bio disponibilidade, toxicidade e mobilidade dos íons metálicos no ambiente. Do ponto de vista ambiental, o valor da concentração total de um elemento está se tornando sem muita importância, no entanto, o que é indispensável é o conhecimento das várias formas que ele se encontra e que pode se transformar se sofrer mudanças das características, físicas, químicas e biológicas do meio.

Processos clássicos de oxidação: Permanganato, Peróxido de Hidrogênio, Cloro e derivados e Ozônio
Dentre os processos oxidativos mais tradicionais, a escolha do oxidante é realizada levando-se em consideração: os custos, a segurança de operação e o domínio da tecnologia a ser utilizada. Além disso, é importante ter conhecimento se o composto alvo é único ou uma mistura de compostos, bem como se a reação vai acontecer em meio aquoso, no solo ou no ar. A característica da matriz é de fundamental importância.
Os ânions permanganatos (MnO4-), usualmente estão combinados com os cátion sódio ou potássio, são bons oxidantes. Tais compostos apresentam uma intensa coloração violeta em solução aquosa. O elemento manganês em seu maior estado de oxidação (Mn7+) recebe elétrons dos compostos a ser oxidado e pode se reduzir para um menor estado de oxidação (Mn4+). O permanganato de potássio é útil para inativar bactérias e fungos, sendo também um bom cicatrizante para as feridas; em estações de tratamento de água como pré-oxidante e em tratamento de solos contaminados.
O peróxido de hidrogênio (H2O2) é um oxidante bastante versátil. É utilizado como antisséptico, no clareamento de cabelos, de dentes, no controle de poluição, na recuperação de solos, no tratamento de águas subterrâneas, nos processos de branqueamento nas indústrias têxtil, de papel e celulose. Nos últimos anos o seu consumo no Brasil teve um aumento muito grande. Esse composto é considerado um dos compostos ambientalmente correto, pois os produtos de sua degradação são moléculas de água e oxigênio, dois compostos naturais.
Sem dúvidas o cloro é um dos oxidantes mais utilizados. A principal aplicação é na desinfecção de águas destinadas ao abastecimento público. O processo de cloração é de amplo domínio e os custos são relativamente inferiores aos outros oxidantes também mais usuais. O cloro é utilizado na forma gasosa (Cl2) e na forma de sais, como hipoclorito de sódio (NaClO) e de cálcio (Ca(ClO)2). Uma das grandes vantagens desse composto é a permanência de residual na água, porém uma das desvantagens é a formação de trialometanos.
Um oxidante derivado do cloro de grande destaque é a cloramina (Cl2/NH3), que é a aplicação de cloro e amônia na água numa correta proporção; o outro é o dióxido de cloro (ClO2). Ambos possuem um baixo potencial de formação de trialometanos, pois não há a presença de cloro livre.
O ozônio foi primeiramente identificado em 1840 pelo químico alemão C.F. Schonbein (1799-1868), que percebeu o odor produzido durante a geração de uma faísca elétrica, recebendo o nome ozônio, que é derivado do Grego ozein, cheirar. O gás que na temperatura ambiente é incolor e recebeu este nome devido seu odor caracteristicamente pungente. O ozônio é uma molécula tri-atômica alótropado oxigênio e sua formação é endotérmica:

3 O2 ↔ 2 O3ΔH°f (1 atm) = + 284,4 kJ mol-1

Ozônio é um forte agente oxidante, capaz de participar de muitas reações químicas com substâncias orgânicas e inorgânicas. Comercialmente, ozônio tem sido aplicado como um reagente químico na síntese de diferentes compostos, usado para purificação de água potável, como desinfetante em tratamento de efluentes, e como descolorante de fibras naturais.

Princípios básicos dos processos oxidativos avançados (POA): radicais livres e mecanismos de reação radicalar
Os processos oxidativos avançados (POA) são tecnologias desenvolvidas nos últimos anos que se baseiam em processos físico- químicos capazes de alterar profundamente as estruturas químicas dos contaminantes (compostos orgânicos e inorgânicos), bem como na inativação de micro-organismos.
Embora façam uso de diferentes sistemas de reação, estes processos envolvem a geração de radicais hidroperoxila (HO2•), radicais superóxido (O2•-) e, principalmente, os radicais hidroxila (HO•), sendo esses últimos altamente oxidantes e não seletivos.
(• representa um elétron desemparelhado).
O potencial de oxidação dos HO• é de 2,80 V, maior que o do ozônio, peróxido de hidrogênio, permanganato, dióxido de cloro, cloro e derivado e oxigênio, menor apenas que o do flúor. Por exemplo, quando comparados ao ozônio, os radicais hidroxila reagem cerca de um milhão a um bilhão de vezes mais rápido com a grande maioria dos contaminantes encontrados usualmente em águas residuárias. As constantes de velocidade (k) de reação do radical hidroxila com fenóis ficam na faixa de 109 – 1010, e com ozônio em 103.
Os radicais hidroxila podem reagir com os contaminantes por diferentes mecanismos, dependendo da estrutura química do composto a ser degradado. Na abstração de hidrogênio (H) há a produção de radicais orgânicos (R•), que se ligam ao oxigênio molecular (O2) gerando radicais orgânicos peróxido (RO2•), que por sua vez, iniciam reações oxidativas em cadeia, resultando na mineralização do substrato; na adição eletrofílica os radicais hidroxila são ligados aos compostos orgânicos formando radicais orgânicos (RO•) e na transferência de elétrons ocorre a oxidação dos compostos (R+) e formação de ânions hidroxila (OH-).
De forma geral, os POA apresentam muitas vantagens quando comparados aos processos de tratamento convencionais: podem mineralizar o poluente, não somente o transferindo de fase; dependendo do processo, podem não formar subprodutos se utilizado oxidante suficiente, ou se formam em baixa concentração; são usados para degradar compostos refratários, transformando-o sem biodegradáveis ou reduzindo sua toxicidade, podendo assim ser utilizados em conjunto com outros processos (geralmente biológicos) como pós e/ou pré-tratamento; tem forte poder oxidante, com cinética de reação elevada; geralmente não necessitam de póstratamento ou disposição final; melhoram as qualidades organolépticas da água tratada; em alguns casos pode consumir menos energia, acarretando menor custo; podem ser utilizados para tratar baixas concentrações de poluentes, como por exemplo, na faixa de microgramas por litro (ou ppb) e possibilitam tratamento "insitu".

Processos oxidativos avançados: peroxidação assistida por radiação ultravioleta, reagente de Fenton, foto-Fenton, focatáliseheterogênea, ozonização assistida por ultravioleta e em meio básico
Dentre os vários processos para a obtenção destes radicais livres, existem os processos homogêneos, onde o catalisador e o substrato formam uma única fase; e os sistemas heterogêneos, quando o substrato e o catalisador formam um sistema com mais de uma fase; geralmente, são processos que possuem catalisadores na forma sólida. Estes sistemas homogêneos e heterogêneos podem ser submetidos à irradiação ou não.
O processo que combina o peróxido de hidrogênio com radiação ultravioleta com λ< 400 nm, (H2O2/UV) é muito mais eficiente do que o uso de cada um deles separadamente, devido a grande produção de radicais hidroxila. O mecanismo aceito é a quebra da ligação entre os dois átomos de oxigênio da molécula de peróxido de hidrogênio em dois radicais hidroxila.

H2O2 + hυ→ 2 HO•

O reagente de Fenton (Fe2+/H2O2) é um processo simples de geração de radicais hidroxila e que não requer a utilização de reagentes ou aparatos especiais. A oxidação dos compostos orgânicos com o reagente de Fenton ocorre na presença de íons ferrosos (Fe2+) com peróxido de hidrogênio, em solução ácida, por meio de reações em cadeia que produzem radicais hidroxila. Neste caso, o ferro é considerado como catalisador e o H2O2 é o agente oxidante.

Fe2+ + H2O2 → Fe3+ + OH- + HO•

O processo foto-Fenton (Fe2+/H2O2/UV) consiste na combinação do reagente de Fenton com radiação ultravioleta, aumentando significantemente a velocidade degradação de compostos alvo. Isso se deve principalmente às seguintes considerações: os íons férricos (Fe3+) em solução aquosa existem na forma de aquo/hidroxo complexos, e, quando irradiados, são reduzidos a íons ferrosos (Fe2+), além de produzir radicais hidroxila adicionais; os complexos férricos formados pelos íons Fe3+ e moléculas orgânicos geradas no processo de degradação, quando irradiados também levam à redução de Fe3+ a Fe2+, ou seja, a foto descarboxilação; e a própria fotólise do peróxido de hidrogênio gera mais radicais hidroxila no meio. Sem dúvidas, o efeito mais importante é a regeneração dos íons ferrosos que podem reagir novamente com o peróxido de hidrogênio para gerar mais radicais hidroxila, criando um ciclo fotocatalítico Fe2+/Fe3+. Com isso, o uso da radiação UV reduz significantemente as concentrações iniciais do íon ferroso, quando comparadas às utilizadas no reagente de Fenton.
Na foto catálise heterogênea (TiO2/UV), um material semicondutor é exposto à radiação ultravioleta. Uma partícula de um semicondutor é caracterizada por duas bandas, uma de valência (BV) e outra de condução (BC), sendo que a diferença de energia existente entre elas é chamada de band gap. Quando um fóton é absorvido, com energia superior à energia da band gap, um elétron é promovido da banda de valência para a banda de condução (e-), deixando, portanto, uma lacuna (h+) na primeira banda. Estes vazios irão apresentar potenciais positivos, suficientes para gerar radicais hidroxilas (HO•) provenientes de moléculas de água adsorvidas na superfície do semicondutor.
Além do radical hidroxila outras espécies também colaboram com a degradação das células, tais como radicais superóxido (O2•-) e hidroperoxila (HO2•) são formados pela captura de elétronsfotogerados. Nesse processo é possível utilizar lâmpadas germicida (λ = 254 nm) e ou a lâmpada de luz negra (λ = 300 - 425 nm) e, principalmente, por luz solar. A forma alotrópica de TiO2 mais utilizada é a anatase, por ser mais fotoativa.
No processo de ozonização assistida por ultravioleta (O3/UV), o radical hidroxila é produzido a partir do ozônio, água e radiação ultravioleta (λ < 310 nm). Usualmente são utilizadas lâmpadas germicidas de mercúrio. Tem sido proposta que tal processo envolve duas etapas, a primeira delas é a homólise do ozônio formando oxigênio molecular e atômico, esse último reage com moléculas de água formando peróxido de hidrogênio e/ou radicais hidroxila.

O3 + H2O + hu → 2 HO• + O2

A ozonização em meio básico (O3/OH-) pode ser utilizada para a produção de radicais hidroxila. O tempo de meia vida do ozônio pode variar de segundos até várias horas, dependendo das características do meio em que esse oxidante se encontrar. A estabilidade do ozônio é dependente de algumas variáveis. O potencial hidrogeniônico (pH) merece destaque, pois o processo de decomposição do ozônio é iniciado por íons hidroxila.

O3 + OH- → HO2- + O2

O3 + HO2- → HO• + O2- + O2

A elevação do pH do meio ou a adição de peróxido de hidrogênio pode acelerar a decomposição do ozônio. Durante o processo de ozonização, a oxidação de substâncias orgânicas e inorgânicas pode ocorrer via ozônio molecular (reação direta - predominante em meio ácido) ou radical hidroxila (reação indireta - predominante em meio básico), porém os dois mecanismos acontecem concomitantemente com diferente contribuição.

Exemplos de empresa e tecnologias POA
Muitas são as empresas que trabalham no desenvolvimento e aplicação de processos oxidativos avançados em grande escala para tratamento de águas de abastecimento, águas residuárias, águas de resfriamento, lixiviados de aterro sanitário, ar e solos. Uma grande parte delas utiliza processo baseados em ozônio e processos conjugados com biológicos. Segundo AOT Handbook Calgon Corp. já em 1996 havia mais que 200 instalações utilizando a peroxidação assistida por radiação ultravioleta (H2O2/UV) para tratamento de água subterrânea e potável. Um dos exemplos do Brasil é a tecnologia denominada Fentox®, desenvolvida na UNICAMP, foi licenciada é comercializado pelas empresas Tratch e Tratch-Mundi, do Grupo Ecotech. Outras empresas que trabalham com essas tecnologias são: Calgon Carbon Corporation, Wedeco, Anseros Advanced Oxidation, Tecnologies, Redox Technologies, Inc., Ecosphere Technologies, Inc., Magnum Water Technology, Inc., U.S. FilterlZimpro, Inc., Matrix Photocatalytic, Inc. (Matrix), Process Technologies, Inc., ZentoxCorporation (Zentox) UV/TiO, KSE, Inc. (KSE).

 

 

Prof. Dr. José Roberto Guimarães
Possui graduação, mestrado e doutorado em química pelo Instituto de Química (IQ) e títulos de professor livre-docente e titular pela Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC), ambos da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Forte experiência na área de Química Sanitária e Ambiental, atuando principalmente na aplicação de processos oxidativos avançados na degradação de moléculas persistentes e fármacos de uso veterinário,no tratamento de efluentes potencialmente tóxicos e na inativação de microrganismos emergentes e re-emergentes presentes em águas. Atualmente é chefe do Departamento de Saneamento e Ambiente (DSA) e do Laboratório de Processos Oxidativos (LABPOX) da FEC. É bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq.

 

 


Referências bibliográficas:

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Dezotti, M. Processos e Técnicas para o Controle Ambiental de Efluentes Líquidos.E-papers Serviços Editoriais Ltda, Rio de Janeiro, 2008.

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