A Importância De Cálculos De Transiente Hidráulico Em Tubulações
Por Carla Legner
Edição Nº 36 - abril/maio de 2017 - Ano 6
A preocupação com a manutenção de sistemas eficientes que possam suprir as necessidades da população em termos de pressão e vazão é um dos grandes desafios dos engenheiros responsáveis pelo abastecimento de água nas cidades
A preocupação com a manutenção de sistemas eficientes que possam suprir as necessidades da população em termos de pressão e vazão é um dos grandes desafios dos engenheiros responsáveis pelo abastecimento de água nas cidades. Para que isso ocorra de forma eficiente são criadas redes de distribuição cada vez mais complexas que dependem da operação adequada de bombas, válvulas, reservatórios, entre outros dispositivos e principalmente do perfeito estado das tubulações.
As manobras realizadas em válvulas, partidas e desligamentos das bombas de recalque, mudanças na demanda e de nível de reservatórios causam mudanças de estado do escoamento na tubulação, inicialmente em regime permanente, o escoamento passa por um estado transitório até atingir outro estado permanente de escoamento. Durante este estado transitório ocorrem os chamados transientes hidráulicos.
São ondas de pressão que se movem rapidamente ao longo de uma tubulação, causando elevações ou quedas de pressão, podendo ser de grande ou pequena magnitude. Em relação às de pequena magnitude, na maioria dos casos, as variações de pressão podem ser desconsideradas, porém vale ressaltar que em determinadas situações sua influência é muito significativa, podendo gerar consequências desastrosas, inclusive pondo em risco vidas humanas.
Variações de pressão de grande magnitude são responsáveis por diversos problemas. Quando por consequência de um evento transitório são geradas sobrepressões, na qual são criadas tensões elevadas nas paredes da tubulação que podem vir a rompê-la ou mesmo gerar a fragilização das paredes dos condutos com a repetição destes fenômenos. Já quando há ocorrência de subpressões, é possível chegar-se a níveis de pressão de tal forma inferiores à pressão atmosférica que pode ocorrer o achatamento das canalizações, mesmo as confeccionadas com materiais muito resistentes.
As sobrepressões e subpressões que ocorrem durante o transitório hidráulico podem causar sérios problemas à tubulação e seus equipamentos. Quando não dimensionados para suportar tais sobrecargas comprometem a segurança e o funcionamento do sistema. Diante desse cenário, a quantificação das pressões máximas e mínimas é de extrema importância para o projeto para que possa dimensionar a tubulação e introduzir equipamentos protetores, com o intuito de suavizar as variações de carga, prejudiciais à vida útil da instalação.
Outra consequência dos fenômenos transientes em sistemas de adução pode ser a contaminação da água devido ao desprendimento de impurezas e de microrganismos incrustados nas paredes da tubulação. Além disso, as perdas de água, os transtornos gerados pelo desabastecimento e os gastos despendidos nos reparos do sistema oneram significativamente as companhias de água, e ainda mobilizam grandes equipes de técnicos e canteiros de obras que acarretam os mais diversos inconvenientes.
De acordo com Francisco Veiga, representante da Fluidotech, vazamentos não desperdiçam somente água e energia, estudos apontam que contaminantes, incluindo vírus e bactérias, provenientes de fezes humanas ou de outras fontes, podem entrar nas tubulações e serem transportados nas redes de distribuição de água tratada, eles podem ser sugados através de vazamentos e sequencialmente ingerido pela população.
"O que deve ser observado com muito cuidado é que microrganismos, inclusive patógenos, que entram nas tubulações mesmo em quantidades pequenas e podem acessar as ligações entre a rede de distribuição e as residências durante a inversão do fluxo característico do transporte do fluido", explica Francisco. Para ele o controle operacional é fundamental para diminuir esses riscos de contaminação, e para o domino desse processo se faz necessário o conhecimento em transientes hidráulicos.
Principais métodos de análise
Se não analisados e considerados de forma correta, os fenômenos dos transientes hidráulicos podem criar sérios distúrbios em um sistema de distribuição de água. Os processos devem ser projetados para funcionar em condições normais de escoamento, e em condições extremas causadas por agentes externos que possam gerar pressões muito maiores ou muito menores às condições ideais de funcionamento.
Para a análise dos transientes hidráulicos é preciso resolver paralelamente as equações da continuidade e da quantidade de movimento e as equações que fornecem a carga e a vazão numa determinada posição da tubulação em função do tempo. Juntas, elas formam um sistema de equações diferenciais do tipo hiperbólico quasi-linear cuja solução analítica exata não é disponível, porém diversos métodos gráficos, analíticos e numéricos foram desenvolvidos para se chegar a uma solução aproximada.
Substituindo os métodos algébricos e gráficos, que devido a sua menor aproximação não devem ser utilizados para análise de grandes sistemas ou sistemas tendo condições de contorno complexas, são utilizados atualmente diversos métodos numéricos são utilizados para analisar os transientes hidráulicos. A maior parte deles utiliza as equações do movimento, da continuidade e da conservação de energia, além de outras propriedades físicas relacionadas ao material dos condutos e ao tipo de fluido.
Dos métodos utilizados atualmente destacam-se: o Método das Características, Método das Diferenças Finitas, Método dos Elementos Finitos, Método Espectral e o Método dos Elementos de Contorno. Os modelos computacionais possuem a vantagem de permitir a análise de sistemas complexos de engenharia hidráulica, com maior precisão e um menor intervalo de tempo. Assim, é possível utilizar um maior número de seções de integração, obtendo um aumento de precisão no cálculo do transitório.
O método das características se destaca, pois se tornou popular e extensivamente usado. Para a solução de problemas transientes unidimensionais, o método vem mostrando ser superior aos outros métodos em muitos aspectos, ele apresenta a correta simulação da propagação de ondas, é eficiente e de fácil programação. Além disso, as condições de contorno podem ser as mais diversas.
Método Aritmético: Este método não considera o atrito e outras perdas na tubulação, mas introduz aproximações e pode ser considerado como o mais simples método de análise de transientes.
Método Gráfico: Para a utilização deste método, algumas simplificações devem ser feitas. Os transientes são normalmente calculados nas extremidades da tubulação e assume-se que as perdas estejam localizadas em apenas um ponto, seja na entrada ou na saída da tubulação. O método gráfico pode ser resolvido à mão ou com auxílio de softwares de desenho, o que pode afetar sua precisão.
Método das Características: Um método bastante utilizado para problemas de transientes hidráulicos é o Método das Características. É capaz de converter duas equações diferenciais parciais em quatro equações diferenciais ordinárias que podem ser resolvidas por diferenças finitas com o auxílio de um computador e será descrito em mais detalhes posteriormente.
Método Algébrico: As equações algébricas usadas neste método são basicamente as duas equações características para as ondas de pressão nos sentidos positivos e negativos da tubulação, na qual são escritas de forma que o tempo é identificado nas equações, relacionando o número de incrementos no tempo desde o início do transiente. As vantagens do uso deste método são: Problemas simples podem ser resolvidos por calculadoras manuais; Podem ser resolvidos no sentido contrário do tempo quando necessário; Pode ser aplicado em várias seções da tubulação, sem a necessidade de se calcularem os transientes em outras seções.
Método de Análise Linear: Uma solução analítica para os transientes pode ser obtida linearizando-se o termo de atrito e utilizando outros termos não lineares na equação do movimento.
Método Implícito: Este método utiliza a teoria de diferenças finitas para a resolução de problemas de transientes. O procedimento é particularmente aplicável em situações onde as forças de inércia não são tão importantes. O método foi formulado para que a manutenção de uma relação entre o incremento de tempo Δt e o incremento de comprimento da tubulação Δx não seja necessário, deste modo oferecendo um esquema mais flexível para sistemas complexos. Entretanto é necessário uma solução simultânea para as incógnitas a cada incremento de tempo.
Métodos Simplificados de Análise: Consistem em determinar a fase ou período da tubulação, que é o tempo de deflexão das ondas de choque, e a partir disso definem-se as manobras rápidas ou lentas com os dispositivos na tubulação. Manobras rápidas são aquelas que ocorrem em tempo menor que a fase da tubulação e manobras lentas as que ocorrem em tempo maior. Tendo feito isto, utiliza-se a equação de Alliévi e de Michaud para as manobras rápidas e lentas, respectivamente, que são apresentadas abaixo para o cálculo da máxima sobrepressão.
"A análise e a medição dos transientes são essenciais para o projeto e operação dos sistemas, a complexidade dela reside na necessidade de, em cada instante do regime transitório, ter em consideração a interação das ondas elásticas de pressão com todos os componente ou elementos da instalação", ressalta Francisco.
Projetos e normas
Para o projeto de sistemas que envolvam os fenômenos de transientes hidráulicos, tais como estações elevatórias de água e esgoto, adutoras, emissários, entre outros, devem ser definidas previamente todas as características físicas do escoamento e estabelecidas as possíveis condições de operação dos equipamentos (bombas, válvulas, etc.). A partir dessa questão é possível estabelecer processos de cálculo que permite a determinação das pressões extremas que ocorrem nos vários pontos de uma instalação.
Além das características físicas, devem ainda ser definidas as características das tubulações e soluções impostas para se definir as limitações do projeto e garantir a segurança operacional das instalações durante seu funcionamento. O sistema também deve ser considerado, envolvendo condições operacionais distintas e estabelecendo para cada uma delas parâmetros adequados. Estas condições operacionais podem ser dividas em condições normais de operação, condições emergenciais e condições anormais extremas.
Francisco ressalta que existem diversos esforços sobre as tubulações que devem ser levados em consideração, tais como ações dinâmicas, relacionados a cargas vivas (ventos, transportes de modo geral, vibrações), dilatações térmicas etc. "Mas sem dúvida alguma, a base para a decisão decorre do conhecimento da carga máxima geralmente associada aos transientes hidráulicos", completa o professor.
Para o projetos de saneamento ambiental existem diversas normas, dentre as quais, duas delas dão enfoque às questões relacionadas aos transientes hidráulicos. Estas normas são a NBR 12214/1992 e a NBR12215/1991 que tratam, respectivamente, do projeto de sistemas de bombeamento de água para abastecimento público e do projeto de adutora de água para abastecimento público.
A primeira está relacionada ao Projeto de Sistema de Bombeamento de Água para Abastecimento Público. Esta norma é a primeira a apresentar o termo golpe de aríete para sistemas de abastecimento de água. Ela diz que o cálculo do escoamento em regime variável, bem como a recomendação de dispositivos de proteção do sistema deve ser feito de acordo com a NBR 12215/1991, e no projeto da estação elevatória devem constar informações sobre o momento polar das partes girantes e as limitações dos conjuntos motor-bomba quanto à máxima rotação reversa.
A norma NBR 12215/1991, por sua vez, trata do Projeto de Adutora de Água para Abastecimento Público e faz referência a esta outra norma para o cálculo dos transientes hidráulicos. De fato, a norma apresenta diversas recomendações quanto ao estudo e do golpe de aríete e suas implicações. Segundo a NBR 12215/1991, a análise do golpe de aríete deve ser feita para: a) Projeto de novas adutoras; b) Instalações existentes onde ocorram ampliações com alteração das pressões e ou vazões de regime em qualquer seção da adutora; c) Instalações existentes quando se alteram as condições de operação.
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