Passivo ambiental de uma atividade industrial
Por Dr. Luciano Peske Ceron
Edição Nº 6 - abril/maio de 2012 - Ano 1
O termo “passivo ambiental” traduz as consequências presentes e futuras relativas ao meio ambiente, decorrentes de um passado de inobservância da legislação; os custos de adequações operacionais e de recuperações; e até mesmo eventuais indenizações.
O impacto das atividades da empresa no meio ambiente deve ser evidenciado pela contabilidade, pois cabe a ela a elaboração e fornecimento de informações sobre eventos ambientais que causam modificações na situação patrimonial da entidade. Desta forma, a contabilidade deve auxiliar os gestores das empresas cujas atividades gerem ou possam vir a gerar danos ao meio ambiente quanto ao gerenciamento empresarial das relações com o meio ambiente e especificamente nos aspectos de divulgação desses fatos. Neste sentido, através da Resolução 1003/04 aprovou a norma Brasileira de Contabilidade Técnica NBC T-15 – Informações de Natureza Social e Ambiental que estabelece procedimentos para evidenciação de informações de natureza social e ambiental, objetivando que seja demonstrada à sociedade e negociações, a participação e a responsabilidade social das empresas.
Passivo ambiental
Na percepção geral, o passivo é obrigação, um valor monetário decorrente da inobservância a requisitos legais, custo de adequações operacionais e de recuperação ambiental incluindo indenizações. Deve-se exigir a obrigação no presente como decorrência de um evento ou transação passada, através da ocorrência de um fato gerador como a compra de um equipamento para sanar determinada obrigação.
Normalmente, o surgimento dos passivos ambientais dá-se pelo uso de área, lago, rio, mar e uma série de espaços que compõem nosso meio ambiente, inclusive o ar que respiramos, e de alguma forma estão prejudicados, ou ainda pelo processo de geração de resíduos ou lixos industriais de difícil eliminação.
Efetivamente, o passivo ambiental sempre será transferido no ato da compra e venda de um empreendimento, pois este acompanhará a atividade e o imóvel. Contudo, a responsabilidade sobre o passivo não será transferida completamente. O comprador do empreendimento com passivo o assumirá, mas o vendedor não se desincumbirá de suas responsabilidades, pois, perante o poder público, ambos serão responsáveis solidários: os geradores da poluição e o atual proprietário do empreendimento e/ou, inclusive, o proprietário do imóvel. O gerador da poluição sempre poderá ser denunciado a recuperar o ambiente degradado, não há prazo prescricional. O mesmo vale para os atuais proprietários ou operadores. Até mesmo a distribuidora é responsável.
Responsabilidade civil no direito ambiental
Os artigos 14 e 15 da Lei 6.938/1981 tratam sobre as penalidades previstas, na hipótese de descumprimento das normas ambientais. Destaque-se que o poluidor, independente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade. O Ministério Público terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
Um elemento essencial da responsabilidade civil é a existência de culpa, porém é exigida apenas na responsabilidade subjetiva, pois nem sempre o lesado consegue comprovar a culpa do agente, portanto é necessário presumí-la. Neste caso, a responsabilidade é chamada de objetiva. Estas circunstâncias se consolidaram, pelo fato de que, em algumas vezes a prova da culpa do agente torna-se um empecilho para que este possa ser responsabilizado, e não seria justo deixar uma situação impune, pela dificuldade de produção de provas, desta forma, cabe ao agente provar a ausência de culpa para que não seja responsabilizado.
A adoção da responsabilidade objetiva por danos ambientais ocorreu, primeiramente, por possuir um carácter difuso, que cabe, portanto, a toda uma coletividade de pessoas, por isso, não apenas o interesse de uma única pessoa que está buscando atender, mas sim, de um grupo indeterminado, e em segundo lugar, porque seria muito difícil, ou na maioria das vezes, impossível, provar a culpa do causador do dano.
Segundo a ONU, existem pelo menos três tipos de obrigações ambientais:
• Legais: decorrem das legislações, penalidades impostas por lei em decorrência da responsabilidade objetiva das organizações pela não observância das normas ambientais;
• Construtivas: são aquelas que as empresas se propõem a cumprir, em função das responsabilidade social e preocupação da sua reputação na sociedade, independente de exigência legal;
• Justas (equitativas): a empresa assume uma obrigação por fatores éticos e morais, independentemente de lei. Ocorre nos casos em que mesmo não sendo responsabilizada, a empresa se propõe a reparar o dano causado.
Não podemos deixar de citar a Lei 9.605/1998 que trata dos crimes ambientais, uma vez que, vem causando grande polêmica quando a possiblidade de ser aplicada às pessoas jurídicas.
A obrigação de reparar os danos causados em decorrência da responsabilidade civil, segundo o parágrafo 3º, do artigo 225 da Constituição Federal, poderá se sujeitar a sanções penais e administrativas. Neste sentido, a Lei 9.605/1998, que trata de crimes ambientais, regulamenta essa possibilidade no seu artigo 3º. Dessa forma poderá ser imputada a empresa a infração prevista no artigo 54, o qual estabelece: Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora: a pena será de um a quatro anos e multa.
O parágrafo 2º do artigo supracitado, estabelece ainda que:
Se o crime: ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em lei ou regulamentos: a pena será de reclusão, de um a cinco anos.
Evidenciação
Até pouco tempo atrás, as regras jurídicas preocupavam-se mais em impor indenizações pelos danos, do que procurar evitá-los, ou ainda, quando já tivessem ocorrido, em recompô-lo ao status quo ante. Com o passar do tempo, houve uma inversão de valores e os legisladores passaram a dar uma importância muito maior à prevenção, procurando fazer com que o Estado e as empresas abstenham-se de práticas potencialmente nocivas ao meio ambiente.
As exigências sobre a evidenciação dos passivos ambientais até pouco tempo estavam restritas ao mercado internacional, entretanto, diante da repercussão de alguns desastres ambientais de grandes portes em nosso país, os organismos nacionais também passaram a requerer o salvo-conduto de um relatório de duo diligencias sobre os riscos ambientais em indústrias.
Na verdade, a evidenciação do passivo ambiental, passa antes pela sua identificação, que além das formas já mencionadas, pode ocorrer também através de dois estudos técnicos exigidos pelas autoridades governamentais. O primeiro é conhecido por Estudo de Impacto Ambiental (EIA), que objetiva identificar todos os impactos ao meio ambiente que possam ter sua origem nas atividades das organizações, assim como os mecanismos que devem ser utilizados para estancar esses impactos. Este documento serve não apenas para identificar os fatos geradores dos passivos ambientais, mas também para atribuição de valores, pelos custos dos insumos, pelos investimentos em máquinas e equipamentos, extensão das áreas a serem recuperadas, ou pelo volume de refugos que precisam ser tratados.
O segundo, denominado de Relatório de Impacto ao Meio Ambiente – RIMA, cuja finalidade é descrever as ocorrências em relação ao meio ambiente durante o processo operacional, o que possibilita identificar os efeitos ambientais e a mensuração dos custos inerentes aos mesmos.
As informações de natureza ambiental são evidenciadas, via de regra, no Brasil, de forma segregada na estrutura tradicional do Balanço Patrimonial e Demonstração de Resultados, mediante contas de natureza ambiental, com menções no Relatório da Diretoria e em Notas Explicativas. Por outro lado, algumas alternativas foram criadas para divulgação como Balanço Social, Ecobalanço, Demonstrações Alternativas, Quadros Suplementares, entre outros. Nestes devem ser relatados os gastos decorrentes da questão ambiental, que constituem uma informação materialmente relevante, necessariamente evidenciado nos demonstrativos contábeis. Contudo, saber exatamente como fazer esta divulgação de forma clara e objetiva e passa pelas seguintes indagações, quando se trata de evidenciação:
• O quê: todas as informações relativas aos eventos e transações envolvidas com a questão ambiental;
• Como: com o grau de detalhamento exigido pela relevância dos valores e da natureza dos gastos, relativos à interação da empresa com o meio ambiente;
• Quando: o registro contábil deverá ser feito no momento em que o fato gerador ocorrer, ou no momento em que houver informações adicionais e complementares;
• Onde: no corpo das demonstrações contábeis e nas notas explicativas, dependendo da extensão e da natureza das informações a serem prestadas.
Considerações finais
Por fim, cabe salientar que o passivo ambiental não possui relação alguma com o valor econômico do empreendimento, podendo significar mais do que comercialmente vale a atividade. Enquanto a Contabilidade Ambiental tem instrumentos para inserir nos relatórios informações de natureza ambiental, encontramos poucas empresas que realizam as evidenciações financeiras do quanto será provisionado para recuperação da degradação ambiental de suas atividades produtivas.
Apesar de, a aparente responsabilidade ser exclusivamente do meio empresarial, tais questões vão muito além de um segmento especifico. A sociedade civil organizada, entidades filantrópicas, ONGs, consumidores e população em geral, têm um importante papel na proteção do meio ambiente, atuando como agentes ativos na fiscalização e atuação.
Por outro lado, o Estado, em suas diversas esferas de poder, exerce papel fundamental mediante a elaboração de leis e políticas governamentais voltadas para a preservação e conservação do meio ambiente e da implantação de instrumentos coercitivos e fiscalizadores. Podemos dizer que os governos devem fazer valer o seu papel de administrador do patrimônio ambiental e de controlador da conduta de empresas. De fato, a sociedade quer cada vez mais empresas ambientalmente responsáveis, que consigam realizar suas atividades econômicas e ao mesmo tempo preservar o patrimônio ambiental.
Dr. Luciano Peske Ceron
Doutor em Engenharia de Materiais/PUCRS (Meio Ambiente/Filtração), Mestre em Engenharia de Materiais/PUCRS (Polímeros/Nãotecidos), Engenheiro Químico/PUCRS, Especialista em Gestão Ambiental/GAMA FILHO, Especialista em Gestão Empresarial/UFRGS.
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