Sustentabilidade ao extremo
Por Cristiane Rubim - Da Redação
Edição Nº 4 - dezembro de 2011/janeiro de 2012 - Ano 1
O que motivou a cidade de Extrema, situada no sul de Minas Gerais, a se tornar o que é hoje em questões ambientais e a receber tantos prêmios?
O que motivou a cidade de Extrema, situada no sul de Minas Gerais, a se tornar o que é hoje em questões ambientais e a receber tantos prêmios? A resposta, dada pelo gestor ambiental da Prefeitura, Paulo Henrique Pereira, "é a necessidade de crescer e se desenvolver com qualidade de vida, promovendo a melhoria dos indicadores sociais". A explicação de como conseguiram chegar a este resultado: "Com um bom planejamento, muita persistência e muito trabalho. Foi preciso elaborar um bom diagnóstico ambiental do município e montar e capacitar a equipe técnica para dar suporte aos projetos."
As diversas parcerias realizadas também contribuíram com os projetos para o meio ambiente da cidade. No âmbito federal, conforme cita, foram o Ministério do Meio Ambiente e Agência Nacional de Águas (ANA). Já em Minas Gerais, com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente, as ONGs SOS Mata Atlântica e The Nature Conservancy (TNC), Comitê de Bacias PCJ e as empresas privadas Bauducco e Laticínio Serra Dourada.
A Prefeitura de Extrema, segundo o gestor ambiental, investe 6% do orçamento municipal em meio ambiente, o que representa, em 2011, R$ 6,6 milhões. Só no Projeto Conservador das Águas, que será explicado logo a seguir, foram investidos neste ano R$ 4 milhões. Conforme Pereira, com o aumento da arrecadação, para 2012, o valor do orçamento sobe para 8%, sendo equivalente a R$ 8 milhões, estando dentro dos seus objetivos dar continuidade a todos os projetos que iniciaram, como o Conservador das Águas – no qual está prevista a utilização de R$ 5 milhões do orçamento – de Coleta Seletiva, de Licenciamento Ambiental Municipal e de Educação Ambiental.
Com o slogan "Cidade que está vencendo", Extrema vem conquistando diversos prêmios pelo empenho na melhoria ambiental e desponta no cenário brasileiro e mundial. Pelo Índice Mineiro de Responsabilidade Social (IMRS), elaborado pela Fundação João Pinheiro, Extrema ocupa hoje o 1º lugar em Gestão Ambiental no Estado de Minas Gerais e no quesito Qualidade de Vida, que analisa sete indicadores nos 853 municípios mineiros, ocupa ainda a 2ª colocação do prêmio Minas Ecologia, já tendo conquistado três vezes este prêmio. "Os prêmios são importantes para fortalecer o projeto junto à comunidade local e aumentar os apoios por novas parcerias", aponta o gestor ambiental. Extrema conquistou também recentemente o Prêmio Bom Exemplo 2011, promovido pela TV Globo Minas e Fundação Dom Cabral, com o apoio do jornal O Tempo e da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), que este ano mais uma vez premiou o Projeto Conservador das Águas na categoria Meio Ambiente.
Pioneirismo
A promulgação da Lei Municipal nº 2.100, de 21 de dezembro de 2005, que cria o Projeto Conservador das Águas, se tornou a primeira lei municipal no Brasil a regulamentar o pagamento por Serviços Ambientais relacionados à água. Com esta ação, Extrema avança em inovação, dando exemplo de uma concepção simples e democrática. Mas para dar impulso ao projeto, contou com a ajuda de parceiros, como a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Instituto Estadual de Florestas (IEF/MG), Agência Nacional de Águas (ANA), The Nature Conservancy (TNC), SOS Mata Atlântica, Comitê PCJ e Melhoramentos Papéis.
O projeto começou em 26 de fevereiro de 2007 na administração do prefeito Dr. Sebastião A. Camargo Rossi, que tinha como desafio pôr em prática esta demanda da Agenda 21. Firmando um compromisso da Prefeitura, que, desde esta data, vem plantando árvores, protegendo as florestas e cuidando da água. Extrema engloba sete sub-bacias e o projeto está implantado em duas delas, a sub-bacia de Posses e a de Salto, sendo a última a maior do município. Para dar o pontapé inicial ao projeto, foi escolhida a Sub-bacia Hidrográfica de Ribeirão das Posses, por ser a mais impactada no critério de cobertura vegetal, com o início das atividades de campo – isolamento das áreas de preservação permanente e recuperação florestal.
Diante dos estudos e pesquisas científicas realizados por diversas universidades e centros de pesquisa junto com a assimilação de novas tecnologias e o caráter inovador do projeto, o objetivo de ampliar as ações para todas as sub-bacias hidrográficas do município já se mostra viável técnica, social e economicamente. A meta para 2012 do Projeto Conservador das Águas é expandir para a terceira bacia, a de Forjos, de 1.300 hectares. Estão previstas também novas parcerias com o setor privado, exemplo de empresas, como a Panasonic, que está construindo uma fábrica de linha branca em Extrema.
Em 2009, a Lei 2.482 instituiu o Fundo Municipal para Pagamentos por Serviços Ambientais, que faz parte da estratégia pensada pelos parceiros para a continuidade dos pagamentos por Serviços Ambientais após os quatro anos previstos no Termo de Compromisso. Isso para que os proprietários rurais continuem prestando serviços ambientais e viabilizando a replicação do projeto nas demais sub-bacias do Rio Jaguari existentes no município. A expectativa dos executores e parceiros do Projeto Conservador das Águas é de que a adequação ambiental das propriedades rurais e a geração de renda para os proprietários proporcionem o desenvolvimento sustentável da região.
O artigo 2º da Lei nº 2.100 autoriza o Executivo a prestar apoio financeiro aos proprietários rurais que aderirem ao projeto de acordo com o cumprimento das metas estabelecidas (veja quadro). Esse apoio é dado a partir do início das ações e segue por um período mínimo de quatro anos. A lei definiu também o valor de referência a ser pago, fixado em 100 Unidades Fiscais de Extrema (UFEX), equivalente em 2011 a R$ 187,00 por hectare/ano, com base em Relatório Técnico mensal por propriedade emitido pelo técnico do DSUMA. O artigo permite ainda ao município firmar convênios com entidades governamentais e da sociedade civil, possibilitando apoio técnico e financeiro ao projeto e construção de parcerias.
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Metas e deveres dos produtores rurais que aderem ao projeto
Em abril de 2006, o Decreto 1.703 que regulamentou a Lei Municipal 2.100/2005 estabeleceu a assinatura de um termo de compromisso para atingir as seguintes metas:
• Adoção de práticas conservacionistas de solo, com finalidade de abatimento efetivo da erosão e da sedimentação.
• Implantação de sistema de saneamento ambiental rural.
• Implantação e manutenção de Áreas de Preservação Permanente (APPs).
• Implantação da Reserva Legal.
Segundo o Decreto, o produtor rural beneficiário do projeto deve:
• Ter sua propriedade rural inserida na sub-bacia hidrográfica trabalhada no projeto.
• Ter propriedade de área igual ou superior a dois hectares.
• Desenvolver atividade agrícola com finalidade econômica na propriedade rural.
• Ter o uso da água regularizado na propriedade rural.
Segundo consta no livro Conservador das Águas, disponível no site da Prefeitura, foram muitas as dificuldades encontradas para a realização do projeto: convencer os produtores rurais a se engajarem no projeto, vencer a descrença de alguns, encontrar e contratar profissionais com perfil adequado às ações e livres para empreendê-las e gerenciá-las e preparar-se para que mudanças, durante o processo, ocorressem naturalmente, sem traumas e sem descontinuidade. A determinação de vencer a inércia quanto à proteção e conservação das águas foi se sobrepondo, paulatinamente, a todos os entraves e o projeto se concretizou, desenvolveu-se e atraiu interesse de gente de outros Estados e municípios.
Os principais objetivos do projeto são:
• Aumentar a cobertura vegetal nas sub-bacias hidrográficas e implantar microcorredores ecológicos;
• Reduzir os níveis de poluição difusa rural decorrentes dos processos de sedimentação e eutrofização e de falta de saneamento ambiental;
• Difundir o conceito de manejo integrado de vegetação, solo e da água na bacia hidrográfica do Rio Jaguari;
• Garantir a sustentabilidade socioeconômica e ambiental dos manejos e práticas implantadas, por meio de incentivos financeiros aos proprietários rurais.
Os benefícios advindos do projeto são a melhoria da qualidade da água; aumento da vazão média dos mananciais, da cobertura vegetal nativa e da biodiversidade; melhoria na qualidade do solo agrícola; e aumento de renda dos agricultores. Hoje, conforme destaca Pereira, o Projeto Conservador das Águas está consolidado como um projeto da sociedade de Extrema e foi incorporado como um produto da cidade. "A administração atual tem a responsabilidade pela sua execução com maior eficiência possível, mas os resultados alcançados devem ser creditados à sociedade", afirma.
Nascentes do Projeto
De 1996 a 1998, foi realizado em Extrema o Projeto de Execução Descentralizada (PED) componente do Programa Nacional de Meio Ambiente (PNMA) do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Entre as ações executadas, estavam o plantio em áreas de matas ciliares – topo de morro –, práticas conservacionistas de solo, implantação de fossas sépticas e monitoramento da qualidade e quantidade do curso d’água. Após o cumprimento das metas estabelecidas nele, foi detectada a necessidade de elaboração de um diagnóstico ambiental mais aprofundado que fornecesse base técnica às ações de adequação ambiental nas propriedades rurais. Em 1999, com o apoio do Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, foi criado o primeiro termo de referência para elaboração do diagnóstico ambiental dos recursos hídricos nas sub-bacias. A proposta foi apresentada para a Sabesp e, depois, um grupo de técnicos formatou um plano de trabalho, junto ao geógrafo João Roberto Miranda e ao agrônomo Sérgio Antônio da Silva, que trabalharam na proposta até 2000.
Em 2001, foi elaborado o Projeto Água é Vida – Manejo e Monitoramento em Sub-bacias Hidrográficas, tendo como meta a obtenção do Diagnóstico Ambiental de Extrema com mapas e imagens de satélite de alta resolução, levantamento dos meios físicos, bióticos e socioeconômicos e monitoramento físico, químico e biológico dos cursos d´água. Em 2002, foram realizados todos os levantamentos e relatórios propostos. Foi a partir de uma reunião no mesmo ano, na qual foi citada por Antônio Felix Domingues a proposta elaborada pela ANA do Programa Produtor de Água, dando início ao conceito de Pagamento por Prestação de Serviços Ambientais (PSA), que surgiu a ideia da concretização do Conservador das Águas. O de Extrema diferencia-se daquele na forma de remuneração dos prestadores de serviços ambientais, na adequação e saneamento ambiental da propriedade e nas metas de cobertura vegetal. Envolvidos com a elaboração da Agenda 21 em 2003 e 2004, em 2005 foi sancionada a lei. Em 2006, foram elaborados os Decretos e o Termo de Compromisso e a busca por parcerias para recursos financeiros e apoio técnico. O Projeto começa a se tornar conhecido com capacitações, reportagens na mídia e palestras em vários municípios.
Metodologia da restauração florestal
• Uma empresa contratada realiza o mapeamento das propriedades.
• É feito um levantamento das divisas das propriedades, os cursos d’água e nascentes, fragmentos florestais e outros dados para referência.
• Em seguida, são delimitadas as áreas de preservação permanente, segundo o Código Florestal – Lei 4.771 de 1975.
• Técnicos do Departamento de Serviços Urbanos e Meio Ambiente (DSUMA) fazem o contato com o proprietário através de uma visita à propriedade.
• O Projeto é apresentado e, havendo adesão, marca-se outra visita para demarcação das áreas a serem isoladas/reflorestadas.
• Nesta visita, colocam-se estacas nos locais onde a cerca irá passar e realizam-se o registro fotográfico e a análise ecológica das áreas de preservação permanente.
• Na região de Extrema, um dos principais fatores de degradação ambiental é a atividade agropecuária. Desse modo, o isolamento da área é crucial para o início dos processos de restauração florestal. O isolamento é feito através da construção de cercas, com mourões e arame farpado.
• A primeira etapa é a preparação do terreno. Faz-se a limpeza de acordo com cada área através de roçada mecânica, com herbicida ou por coroamento. Em seguida, são feitas covas manuais ou perfuradas. Depois, realiza-se a adubação. Já na fase da irrigação de mudas florestais durante o plantio, e nas semanas subsequentes, por tratar-se de uma operação crucial, principalmente nas épocas secas a alternativa utilizada são os hidrogéis. Eles possibilitam a retenção de água e a sua liberação de maneira gradativa, podendo aumentar a eficácia da irrigação e diminuir as falhas de plantio.
• O controle de formigas é realizado durante a limpeza do terreno.
• A manutenção, de maneira geral, é feita dois meses após o plantio e, posteriormente, a cada três meses. As cercas são acompanhadas mensalmente para verificação da necessidade de possíveis reparos.
• Monitoramento planejando ações com base nas visitas realizadas às propriedades e atividades executadas, tendo relatórios semanais e diários, dos quais no fim de cada mês os dados são transcritos para uma tabela geral com registros fotográficos pré e pós plantio. É necessário avaliar não só a recuperação visual da paisagem, mas também a reconstrução dos processos ecológicos mantenedores da dinâmica vegetal, de forma que áreas restauradas sejam sustentáveis no tempo e cumpram seu papel na conservação.
Para a conservação do solo, o Conservador das Águas, através do projeto desenvolvido pelo professor da Universidade Federal de Lavras (UFLA), Dr. Marx Leandro Naves Silva, encaminhado para a ANA, conseguiu construir bacias de contenção nas estradas rurais, correção de taludes, construção das bacias de captação de água e dos canais de admissão, correção do leito, construção de camalhões e pavimentação do leito da estrada com pedrisco de granito. Já o monitoramento de recursos hídricos vem sendo realizado pela Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), através de convênio com a ANA e apoio da Prefeitura de Extrema. Duas réguas de medição de vazão e cinco pluviômetros foram instalados, com leituras feitas diariamente. São realizadas também campanhas bimestrais de coletas de água para análise de qualidade. Os parâmetros analisados são temperatura, condutividade, OD, turbidez e pH. Sob a coordenação do Dr. Rinaldo de Oliveira Calheiros, do Instituto Agronômico de Campinas, foi instalado vertedouro no curso d’água dentro de propriedade rural para a medição de vazão da quantidade de água produzida nas nascentes. Também foram colocadas réguas de medição de capacidade de retenção de água e sedimentos nas bacias de captação.
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Resultados
Até outubro de 2011, contando as duas bacias foram assinados 100 Termos de Compromisso, construídos 170 mil metros lineares de cerca e plantadas aproximadamente 250 mil mudas de árvores nativas. A equipe de trabalho hoje é composta por 30 funcionários, sendo sete dedicados à construção de cercas e 23 às atividades de manutenção, plantio, monitoramento e avaliação. Em média, são construídos 2.500 metros de cerca/mês. Devido às questões climáticas, há variação nas atividades relacionadas ao plantio, com média de 5 mil mudas plantadas e manutenção de 15 mil mudas/mês.
Desde o início de sua implantação, o Projeto Conservador das Águas se preocupou em desenvolver atividades de educação ambiental. Já chegou a receber também mais 500 visitantes de quase todos os Estados brasileiros e de outros países, técnicos de prefeituras e de órgãos dos Estados e da União, Ministério Público, agentes políticos, vereadores, prefeitos, deputados, representantes de ONGs, comitês de bacias e empresários. Foram realizadas mais de 50 apresentações sobre o projeto Conservador das Águas, em mais de dez Estados brasileiros.
Os projetos trouxeram muitos benefícios à cidade na questão da sustentabilidade, que se divide entre social, econômico, cultural e ambiental, atingindo na média, segundo Pereira, ótimos indicadores. No Índice Mineiro de Responsabilidade Social 2011 (IMRS), organizado e desenvolvido pelo Centro de Estudos de Políticas Públicas da Fundação João Pinheiro, alcançou a 2ª colocação entre 853 municípios do Estado em que foram analisados, com base de dados de 2008 a 2010, 500 indicadores nas categorias nas quais a cidade conseguiu boa posição na maior parte delas: saúde, educação, segurança pública, assistência social, meio ambiente e saneamento, cultura, esporte e turismo, renda e emprego e finanças municipais.
É interessante salientar que, para a construção do IMRS, foram escolhidos indicadores que mostram não só a situação das cidades em cada categoria, mas também os esforços empreendidos para mudá-la. Outra pontuação feita pela cidade vem da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro – Firjan. A entidade desenvolve e coordena o Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM), que analisa os dados de Emprego & Renda, Educação e Saúde de 2009 de 5.565 municípios brasileiros, estando Extrema também na 2ª colocação em nível estadual e atingindo com destaque o 57º lugar no ranking nacional.