Crise Da Água, Estresse Hídrico E Caos Do Esgoto: Aonde Vamos Parar?
Por Cristiane Rubim
Edição Nº 23 - fevereiro/março de 2015 - Ano 4
Diversos especialistas vêm apontando os desafios e soluções, resta analisá-las e colocá-las em prática
"Nós, infelizmente, não fizemos planejamento. Planejamos a crise e o que fazemos hoje é a gestão da crise. Aí, tomam-se as medidas que foram utilizadas no sistema Cantareira, que são corretas e adequadas", afirma Ivanildo Hespanhol, Professor Doutor Titular da Politécnica da USP e diretor do Centro Internacional de Referência em Reúso da Água (Cirra). As medidas a que ele se refere foram redução da pressão da rede, abono pela economia no uso da água – no começo quem economizava 20% tinha redução de 30% no valor da conta e hoje qualquer redução já tem abatimento de 30% –, transferência de água de outras bacias para o Cantareira e uso da reserva técnica do volume morto.
"É uma emergência, mas temos que planejar para a frente. A população foi sensível à crise e contribuiu muito. Agora, temos que aguardar uma chuva forte. Em São Paulo, a chuva é de novembro a março. A que vem caindo no Cantareira não é suficiente para tirar o reservatório do estado em que se encontra, pois o solo está muito seco e absorve a água. Esperamos que o nível suba, senão, será uma crise depois da crise, uma supercrise", adverte.
Já para Luis Antonio Bittar Venturi, Professor Livre Docente do Departamento de Geografia (FFLCH) e coordenador do Programa de Pós-graduação em Geografia Física da USP "para São Paulo não há solução rápida, pois houve planejamento falho em relação à disponibilidade hídrica. Como é que se estimulam a economia e o crescimento, sem pensar se haverá água para tanto?" o mesmo ocorreu com a energia. "Estimulava-se o crescimento, mas não se planejava o aumento da demanda e o que vimos em 2001 foi o apagão. Agora é a mesma coisa. O "apagão da água", afirma Venturi.
Estresse hídrico
De acordo com o prof. Venturi, há dois tipos de estresse hídrico, que significa falta de água:
• Estresse hídrico natural - Típico de uma região que apresenta aridez.
• Estresse hídrico social ou econômico - Quando há água, mas a gestão pública não consegue assegurar um abastecimento correto.
"O estresse hídrico social ou econômico é exatamente o que ocorre com São Paulo, já que temos água suficiente, mas o sistema de captação, tratamento e distribuição é ineficiente para assegurar que todos sejam abastecidos", esclarece. Além disso, o prof. Venturi explica que os dois tipos podem estar combinados, como ocorre por exemplo na Somália. "Existem regiões que o social é mais agravante, caso da Amazônia, onde há os menores índices de acesso à água potável no meio urbano em uma região em que estão as maiores reservas de água do mundo", aponta.
Segundo Marco Neves, especialista em Recursos Hídricos da Agência Nacional de Águas (ANA), o estresse hídrico se caracteriza pela quantidade insuficiente de água para atender a uma determinada necessidade de uso, incluindo a conservação ambiental, e ocorre quando há água de menos ou quando há uso demais, afetando e impactando os sistemas naturais provedores de água. Neves exemplifica, respectivamente, estes dois casos:
• Por uma condição adversa de chuvas, como a que o país está enfrentando no Nordeste e Sudeste, chove muito menos que o normal, diminuindo, consequentemente, as vazões nos rios e a infiltração para os aquíferos.
• A demanda por água, como irrigação, pecuária, indústrias e famílias, cresce em quantidade maior que a disponibilidade, afetando lagos, reservatórios, córregos, riachos, rios e águas subterrâneas.
O estresse hídrico, de acordo com o prof. Hespanhol, ocorre em áreas de baixa precipitação, alto consumo de água, elevado desenvolvimento populacional e demanda industrial e comercial maior que a disponibilidade. Ele explica que existem parâmetros que dimensionam a existência de estresse hídrico e faz um comparativo. "Pelo parâmetro usado de metro cúbico/habitante/ano, na disponibilidade acima de 1.500 m³/hab/ano não ocorre problema, já nos valores mais baixos que 1.500 m³ começam a haver conflitos. A ONU estabelece 1.500 m³ ou 1.700 m³", aponta.
Segundo o diretor do Cirra, a média do Brasil, por causa do Amazonas, é de 30.000 m³/hab/ano. No Nordeste, é de 4.000 mil m³/hab/ano, mas existem áreas que não tem água. "Abaixo de 500 m³, a situação é crítica e inoperacional. Na Região Metropolitana de São Paulo, por exemplo, esse número está em 180 m³/hab/ano, muito abaixo; Alto Tietê, Bacia de Piracicaba, Capivari e Jundiaí e Baixada Santista estão abaixo de 200 m³ e tende a abaixar cada vez mais", adverte. "Hoje estamos em uma região de estresse hídrico. São Paulo está na cabeceira do Rio Tietê, que tem pouca água. São 20 milhões de pessoas, não é suficiente para abastecer. Estamos trazendo cada vez mais água de fora", alerta.
O prof. Hespanhol não concorda com a forma como estão querendo resolver o problema da água em São Paulo e faz uma análise da situação. Segundo ele, o Rio São Lourenço, por exemplo, dispõe de uma adutora de 100 km,
e os custos são no valor de R$ 2,2 bilhões ou US$ 1 bilhão. Existe também a proposta do governo de captar água do Rio Paraíba do Sul para o reservatório da represa do Atibainha, do Sistema Cantareira, com adutora de 15 km. "Estamos na época do aqueduto romano. A nossa proposta é de parar de trazer água de fora. As alternativas são caras e trazem de áreas que já estão com estresse hídrico", diz, indignado.
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Prevenção e combate
Os especialistas consultados pela Revista TAE afirmam que existem formas de prevenir e combater o estresse hídrico. "Planejamento do crescimento populacional da região, gestão da demanda, utilização da água com mais parcimônia e reúso", resume o prof. Hespanhol.
Já para o prof. Venturi, "o estresse hídrico natural é mais difícil de ser combatido porque é preciso transpor água de outros lugares para a região árida, exatamente como se está fazendo com a transposição do São Francisco. Já o estresse social só se resolve com a melhoria da eficiência da gestão. No fundo, os dois são sociais, pois, no primeiro caso, a transposição do São Francisco foi uma decisão social", afirma.
Neves da ANA comenta, "planejar e investir na segurança hídrica, resultado que se alcança quando há diminuição do risco de não atendimento das demandas por água ou do excesso de água causam desastres, como enchentes e deslizamentos. Para tanto, é necessário investir em ações para aumentar a resiliência e redundância quanto aos recursos hídricos", afirma Neves. Segundo ele, resiliência é a capacidade das populações e dos ecossistemas absorverem, com o menor impacto possível, os períodos de escassez. Já redundância é a provisão de intervenções de infraestrutura e gestão que diminuam os riscos de não atendimento das necessidades por água. "Essa é uma questão relevante, ainda mais em um ambiente de crescente incerteza quanto à disponibilidade futura de água. As incertezas quanto ao clima, as crescentes demandas, o desperdício e a degradação dos mananciais contribuem como argumento para a necessidade de melhoria da segurança hídrica no Brasil", ressalta.
Na opinião do especialista em Recursos Hídricos da ANA, a forma de combater a falta de segurança hídrica é, além de melhorá-las, criar, nos períodos de chuva, infraestruturas capazes de armazenar as grandes ondas de cheias para minimizar seus impactos. E nos períodos de secas, como os que atravessamos hoje, melhorar a garantia de oferta de água. "Além disso, é preciso conservar o ecossistema e proteger as zonas de recargas de aquíferos e os sistemas naturais provedores de água, revegetando as matas ciliares das margens de rios, córregos e nascentes. Investir ainda em campanhas de promoção do uso eficiente e consciente da água nas casas, nas indústrias e na irrigação e do reúso da água. O abastecimento público também deve se tornar cada vez mais eficiente, diminuindo as perdas físicas nos sistemas de distribuição", indica.
Efeito dominó
O estresse hídrico acaba afetando os seres humanos, plantas, animais, cidades e o ecossistema como um efeito dominó. "É um recurso vital, por isso, toda a vida na Terra é afetada pela falta de água, inclusive a economia, pois a indústria usa 20% de toda a água disponível e a agricultura, 70%", ressalta o prof. Venturi.
Para o prof Hespanhol, a falta de água traz consequências em tudo, "afeta desde os jardins, indústrias, a produção e até o consumo. Devido ao abaixamento de pressão, há pessoas que não têm água nem para tomar banho", afirma.
Quando uma região passa por um momento de estresse hídrico e não há investimento em segurança hídrica, todas as atividades daquela região são afetadas, alerta Neves. "As famílias precisarão conter seus gastos com água, as atividades econômicas deverão adequar-se à nova situação e as condições dos ecossistemas serão afetadas".
Isso ocorre porque o estresse hídrico eleva o risco de não atendimento da necessidade de água pelas famílias, ecossistemas aquáticos e terrestres e das atividades econômicas nas cidades e no campo, como na irrigação, indústrias, comércio e serviços.
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Excesso populacional nos grandes centros
A ONU projeta que, até 2050, 70% da população mundial estará concentrada nas grandes cidades. O estresse hídrico altera a vida das pessoas das grandes metrópoles, como São Paulo, por exemplo, que se veem hoje diante deste desafio da falta de água. "O homem deve ter capacidade de se adaptar às condições de aridez ou de assegurar o abastecimento da água, canalizando-a e armazenando-a. A crise da água ensina as pessoas a usá-la com mais inteligência. Quando há abundância, há maior desperdício. E ensina o poder público a não ficar contando apenas com a natureza: se chove, tem água; se não chove, não tem. Não dá para uma metrópole como São Paulo ficar à mercê do "chove-não-chove" como se fosse uma sociedade primitiva. Essa vulnerabilidade indica falta de capacidade de planejar e gerir corretamente o recurso hídrico", assinala o prof. Venturi coordenador do Programa de Pós-graduação em Geografia Física da USP.
Quanto à infraestrutura, Neves diz que o estudo feito pela ANA – Atlas Brasil - Abastecimento Urbano de Água – mostra que 3.059 municípios, ou seja, 55% deles respondem por 73% da demanda por água do país e precisam de investimentos prioritários, que totalizam R$ 22,2 bilhões. "Concluídas até 2015, são obras nos mananciais e nos sistemas de produção para evitar déficit no fornecimento de água e poder garantir o abastecimento até 2025 nas localidades indicadas, que vão concentrar 139 milhões de habitantes, ou seja, 72% da população."
Reúso
As atividades econômicas devem investir em uso cada vez mais eficiente da água. Quanto ao reúso da água, Neves diz que tanto aumenta a oferta de água de qualidade inferior para usos menos exigentes quanto reduz a quantidade de água necessária à diluição dos efluentes. Para ele, o reúso de efluentes tratados no Brasil ainda não é uma prática comum. Somente nos últimos 15 anos, por razões econômicas, começou a ser utilizada de forma mais intensa.
De acordo com o prof. Hespanhol, as indústrias, shopping centers, supermercados e postos de gasolina hoje montam uma unidade e têm equipe de operação para fazer o reúso da água. "Com os grandes investimentos que as indústrias vêm fazendo, o reúso da água feito por elas chega até 80%", especifica. Em relação à agricultura irrigada, esse número chega a 80% da água do mundo. "No Brasil, esse número está por volta de 70% e é muito pequeno ainda. Nós temos hoje em torno 70 milhões de hectares plantados, mas só 5% são irrigados. São 3 milhões e meio de hectares irrigados que contribuem com 16% da produção agrícola nacional", enumera.
A irrigação aumenta muito a produtividade, o prof. Ivanildo Hespanhol comenta sobre uma solução para a agricultura, "a nossa proposta é usar o esgoto tratado na agricultura porque a tendência é que a área irrigada no Brasil aumente. Por exemplo, no Nordeste se a areia for irrigada, não nasce nada, a água entra e vai embora. Se colocarmos esgoto tratado, o húmus, a matéria orgânica do esgoto, aumenta a capacidade do solo de reter água e leva os nutrientes, nitrogênio, fósforo e potássio, e os micronutrientes. A produtividade é muito maior e não é preciso gastar em adubo sintético".
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Normas restritivas para reúso
Existem restrições muito grandes quanto ao reúso potável e não potável da água em São Paulo. "Não há como convencê-los sobre este problema. Esses regulamentos estão errados, com falhas muito sérias e irracionalmente restritivos, inibindo a prática de reúso", alerta o prof. Hespanhol. Segundo ele, existe uma proposta de regulamento feita pelas três Secretarias, de Saúde, Meio Ambiente e Saneamento, para reúso urbano não potável que estava na Cetesb para ser assinada. "Intervimos e fizemos uma revisão porque é muito restritiva. É preciso fazer um regulamento que seja realista, já que a prática é feita no mundo inteiro. É uma irresponsabilidade dos produtores de normas. Os nossos rios são iguais de Bangladesh e querem que sejam como os da Escandinávia. É um grande problema que só nós temos. O governo está mais consciente disso. As normas servem para gerir a prática e não para inibi-la", relata, contrariado.
Águas poluídas
As águas superficiais são poluídas por esgoto, efluentes industriais e venenos usados na agricultura. As águas subterrâneas, por sua vez cujo consumo vem aumentando no país, hoje também são atingidas pela degradação e exploração. O saneamento básico tem muitas irregularidades e deficiências ainda. Mas há saídas para todo esse quadro atual. Em São Paulo, por exemplo, a água subterrânea já é usada. "Hoje oito mananciais abastecem 70 m³/s e a água subterrânea 10 m³/s em um total de 80 m³/s. Destes, como 80% da água vira esgoto, 64 m³/s são de esgoto que precisam ser tratados. É preciso parar de jogar esgoto no rio. O problema é que não se pensa em aumentar o tratamento dos rios", diz, indignado, o diretor do Cirra.
O coordenador do Programa de Pós-graduação em Geografia Física da USP alerta, "a saída é simplesmente planejar e gerir adequadamente. Água temos. É insensato pensar que a falta de água seja um problema natural. Os políticos fazem isso para se redimirem de suas responsabilidades. A falta de saneamento adequado e a poluição de águas superficiais ou subterrâneas por esgotos são problemas de gestão e nunca naturais".
Já Neves analisa sob dois pontos de vista: primeiro, da água na natureza em relação à conservação dos ecossistemas e dos mananciais, em uma gestão eficiente dos recursos hídricos que contribua para o desenvolvimento humano e econômico sustentável ambiental. Segundo, da universalização do acesso à água segura para consumo humano e coleta e tratamento de efluentes. "A situação hoje ainda é de um passivo razoável, principalmente na coleta e tratamento de efluentes, o que acaba gerando diminuição da disponibilidade hídrica devido à condição inadequada da qualidade da água. Isso afeta também os custos de tratamento das águas superficiais e subterrâneas captadas", avalia.
A ANA contribui por meio de suas ações de gestão, realização de estudos e implementação de programas. "Além do Atlas Brasil, agora estamos desenvolvendo um estudo sobre saneamento, ambos como colaborações ao setor e como subsídio para nossas ações de planejamento de recursos hídricos e gestão", destaca. Entre os programas, alguns interferem diretamente na melhoria das condições da água: o Programa Produtor de Água (PPA), o Programa de Despoluição de Bacias Hidrográficas (Prodes) e o Programa Nacional de Avaliação da Qualidade das Águas (PNQA).
O PPA funciona como um fomentador da conservação da água no meio rural e, para isso, prevê o apoio técnico e financeiro para estabelecer arranjos institucionais de viabilização do pagamento por serviços ambientais e da execução de ações, como construção de terraços e de bacias de infiltração, readequação de estradas vicinais, recuperação e proteção de nascentes, reflorestamento das áreas de proteção permanente e de reserva legal e saneamento ambiental.
Enquanto o Prodes tem como objetivo incentivar a implantação ou ampliação de estações de tratamento para reduzir os níveis de poluição em bacias hidrográficas. Conhecido também como Programa de Compra de Esgoto Tratado, o Prodes paga pelo esgoto efetivamente tratado, desde que cumpridas as condições previstas em contrato (metas de remoção de carga poluidora), em vez de financiar obras ou equipamentos. Já o PNQA visa ampliar o conhecimento sobre a qualidade das águas superficiais no Brasil para orientar a elaboração de políticas públicas na recuperação da qualidade ambiental em corpos d’água interiores, como rios e reservatórios.
Segundo o prof. Hespanhol, há uma disponibilidade muito grande no raso próximo a 20 metros. "Uma alternativa seria fazer uma bateria de poços e coletar a água, fazer tratamento avançado para eliminar contaminantes e abastecer regionalmente, sem utilizar grandes adutoras, que têm alto custo. Essa é uma possibilidade que provavelmente no futuro as companhias de saneamento vão começar a considerar. É uma água disponível poluída, mas que pode ser tratada e distribuida, e é menos poluída que muitos reservatórios que nós utilizamos", projeta.
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Esgoto gerado deteriora situação e pode causar caos
"Não se fala nada do esgoto. O planejamento hoje em São Paulo está em trazer água de fora. Só se fala nisso. Trazer toda essa água para cá vai gerar cada vez mais esgoto que não tratamos, o que é absurdo! É preciso limpar a cidade do esgoto. A nossa proposta é tratar o esgoto", argumenta o prof. Hespanhol. O diretor do Cirra relembra que as grandes cidades, como Londres e Paris, eliminaram a poluição já no início do século passado.
"O Tâmisa, na Inglaterra, antes era poluído, assim como o Sena, em Paris, e hoje ambos têm peixes. Lá, o governo tomou decisões, aqui não se toma, é preciso mudar o paradigma. Gestão da demanda, redução do consumo e reúso eliminam todos esses problemas. Isso não é para amanhã. O Estado tem que fazer planejamento e grandes investimentos para daqui a dez anos", aponta.
O prof. Hespanhol afirma que não há políticas públicas adequadas pela falta de planejamento e interesse. Como exemplo, ele cita que uma política pública básica seria não trazer mais água de fora ou trazer, fazer o tratamento do esgoto gerado e eliminar este esgoto da cidade. "A reversão do Paraíba do Sul em 5 m³/s mais 5 m³/s do Rio São Lourenço são 10 m³/s que vão chegar até o fim de 2015, gerando 8 m³/s de esgoto. Ninguém falou em fazer uma estação de tratamento para esse esgoto, que vai deteriorar mais ainda a situação de São Paulo porque ele desce todo para o Baixo Tietê e não pode ser bombeado para a Billings. As barragens de Barra Bonita, Bariri, Ibitinga e Promissão estão todas altamente poluídas com o esgoto que vem da Região Metropolitana. Com os rios Tamanduateí, Tietê e Pinheiros também poluídos, o sistema é insustentável", alerta.
"Temos tecnologia para tratar o esgoto e abastecer. A água do esgoto tratada fica melhor que a água que temos hoje. Existem vários países, como Cingapura, África do Sul, Namíbia, Austrália, Estados Unidos e Bélgica, que fazem reúso da água de esgoto na mesma rede de distribuição. Vejo como a solução para São Paulo", destaca. Segundo o prof. Hespanhol, a capacidade instalada do Projeto Tietê, por exemplo, tem cinco Estações de Tratamento de Esgoto, Parque Novo Mundo, São Miguel, ABC, Suzano e Barueri, que geram, em nível secundário, 16 m³/s. Complementando com tratamento mais avançado, seriam 16 m³/s de água potável para ser utilizada.
"Os nossos reservatórios estão todos contaminados com esgoto e lixo, como a água da Guarapiranga e da Billings, por exemplo. Todo mundo fala em reutilizar esgoto, mas, sem percebermos, estamos fazendo reúso há muito tempo. Só que é um reúso não planejado e inconsciente. Este reúso não é seguro.
A proposta é planejar e dar segurança para o reúso", esclarece o prof. Hespanhol.
A explicação é a seguinte: o sistema de tratamento não mudou é o mesmo que existe há cem anos. Hoje existem também os chamados poluentes emergentes, hormônios, fármacos, cosméticos e nanopartículas, que modificaram totalmente a característica dos reservatórios de água. "Por isso, para o reúso será utilizado sistema de tratamento avançado com garantia real de água segura e de qualidade. A água segura é mais importante que a água potável. É uma água que não gera problemas de Saúde Pública nem doenças. Esta água usada hoje pode gerar problemas a longo prazo", ressalta.
Segundo ele, em termos de organismos patogênicos, a água potável distribuída não é tão ruim porque tem o cloro. Mas o que está solúvel na água, metais pesados, pesticidas, biocidas, etc., são compostos não eliminados nos sistemas convencionais de tratamento. "Os lençóis freáticos e superficiais inteiros de São Paulo estão contaminados por estes vários tipos de poluição. Se fizermos reúso, a qualidade da água será muito melhor porque são tratamentos já consagrados que podem permitir uma água de capacidade elevada", finaliza o prof. Hespanhol.
Contatos:
Ivanildo Hespanhol: Universidade de São Paulo (USP) e Centro Internacional de Referência em Reúso da Água (Cirra)
Luis Antonio Bittar Venturi: Universidade de São Paulo (USP)
Marco Neves: Agência Nacional de Águas (ANA)