A Questão Do Odor É Nova Ainda No Brasil
Por Cristiane Rubim
Edição Nº 25 - junho/julho de 2015 - Ano 5
Depois do fornecimento de água potável e da coleta e tratamento de esgotos, a quarta onda do saneamento é o controle de odor
A emissão de gases com mau cheiro vindo das ETEs deve ser prevenida e tratada para não causar incômodos e afetar a saúde da população vizinha às instalações, que vem denunciando o forte odor aos órgãos ambientais. Mais de 50% das denúncias ambientais são sobre odores vindos das ETEs. A falta de saneamento básico, que é um atraso imenso para o país, de planejamento na ocupação urbana e de conscientização das empresas e ETEs quanto às leis ambientais agrava a situação. Para isso, as fornecedoras estão preparadas para oferecer cada vez mais produtos, com novas tecnologias, para resolver o problema do odor e também da corrosão. O mercado é muito promissor, mas, por outro lado, tímido ainda.
O processo de tratamento de esgotos sanitários pode gerar mau cheiro devido aos métodos adotados e às condições operacionais. Conforme Helvécio Carvalho de Sena, químico doutor em engenharia sanitária e ambiental do departamento de planejamento e controle – TBP da Sabesp, normalmente, um sistema de coleta, transporte e tratamento de esgotos não gera odor em concentrações que possam afetar as pessoas. "Porém, algumas condições, como o tempo em que o esgoto fica nas tubulações (tempo de detenção hidráulico - TDH) associado às temperaturas mais elevadas e à falta de oxigênio, estimulam o desenvolvimento de bactérias que reduzem os compostos que contenham enxofre, gerando o sulfeto de hidrogênio (H2S), substância que, na maior parte do tempo, causa o odor. Mas há outras substâncias odoríferas também", explica.
O tratamento de odores pode ser químico ou biológico. Segundo Sena, o local do tratamento do odor dependerá de uma avaliação técnica e pode ser feito tanto na Estação de Tratamento de Esgotos (ETE), na Estação Elevatória de Esgotos (EEE) ou na rede coletora. A redução de odor no Sistema de Esgotamento Sanitário (SES), que envolve também as ETEs, é feita por meio de aplicação de produtos químicos, como o nitrato de cálcio, nitrato de amônia, peróxido de hidrogênio, oxigênio, cloreto férrico, soda cáustica, hidróxido de cálcio e nitrito. "Este é um trabalho preventivo para evitar o desprendimento do sulfeto de hidrogênio na atmosfera", ressalta. Na rede de esgotos, o tratamento químico é o mais utilizado em várias partes do mundo. "Existe também a estratégia de instalar, nos pontos de fuga do gás, exaustores que ‘sugam’ o ar contaminado com o sulfeto de hidrogênio, enviando-o para tratamento em filtros, que podem ser químicos (torres de lavagem) ou biológicos (biofiltros)."
Na figura 1, Sena apresenta um trabalho realizado na Universidade de Hokkaido (Japão). No eixo das ordenadas, repare na profundidade do biofilme, formado nos coletores de esgotos. Na superfície do biofilme, a concentração de oxigênio (O2) é de aproximadamente 30 milimol (uM) e não há presença de sulfeto de hidrogênio (H2S). As medições realizadas dentro do biofilme (900 micrometros) demonstram oxigênio dissolvido zero e a produção de sulfeto na ordem de 200 milimol (uM). "É este o processo que ocorre em qualquer sistema de coleta de esgotos. Na maioria das vezes, a produção de sulfeto não é elevada, o que não causará incômodos à população", observa.
Além do sulfeto de hidrogênio (H2S), de acordo com Jorge M. Pavan, diretor técnico da Eco Tech System Controle Ambiental, os processos de Tratamento de Esgotos Domésticos e Industriais emanam também metano (CH4), solventes aromáticos e solventes halogenados. O sistema de controle de odor capta o fluxo gasoso contaminado por esses poluentes em suas fontes para posterior controle das emissões no equipamento de controle da poluição (ECP). Segundo ele, a tecnologia utilizada no Brasil envolve os processos de oxidação química, adsorção e biofiltração.
Tratamento de odores
Oxidação química
Os gases captados pelo sistema de exaustão seguem para o lavador de gases do tipo torre de absorção com reação química. O controle é feito através da transferência dos poluentes da fase gasosa para a líquida (absorvente). Nos equipamentos com essa tecnologia, podem ocorrer a absorção física e a química. A eficiência deste sistema dependerá da solubilidade do poluente no líquido (absorção física) ou da velocidade da reação entre o poluente e o líquido (absorção química). Os reagentes químicos usados são a soda cáustica (NaOH) + hipoclorito de sódio (NaOCL) e o peróxido de hidrogênio (H2O2).
Oxidação térmica
Nas indústrias ou ETEs que possuem incineradores, é feita a oxidação de compostos odoríficos por combustão a temperaturas superiores a 800°C. O ar da combustão é misturado com gases de geradoras de odores. Sua implantação apenas para tratamento de odores não é viável devido ao alto custo do processo.
Adsorção
A desodorização ocorre através da passagem de ar contaminado por um meio adsorvente com compostos químicos que fazem a oxidação ou inativação das substâncias odoríferas. Os gases captados pelo sistema de exaustão vão para um filtro de carvão ativado, principal meio adsorvente utilizado devido à sua alta eficiência e baixo custo, que fica saturado quando os poluentes são adsorvidos. A adsorção transfere uma molécula de uma fase gasosa para uma sólida, obedecendo às leis de equilíbrio entre a concentração na fase gasosa e na sólida. É importante a manutenção do ambiente livre de umidade e poeira e da troca regular do meio adsorvente. A adsorção é instantânea e com baixa energia e envolve as etapas de:
• Transferência do fluido em direção à camada limite gasosa e ao material poroso;
• Difusão da molécula através da camada limite;
• Difusão da molécula no interior dos poros do material adsorvente.
A capacidade de adsorção de um filtro e sua eficiência dependem dos seguintes parâmetros:
• Quantidade adsorvida no equilíbrio;
• Velocidade e taxa de adsorção;
• Percentagem volumétrica utilizada do filtro.
Biofiltração
Os gases captados pelo sistema de exaustão são direcionados a um biofiltro, que remove compostos orgânicos voláteis e poluentes sulfurados. Os processos biológicos de tratamento de gases transferem compostos voláteis, mal odorantes, para uma fase líquida e, em seguida, degradam estes compostos por meio de microrganismos (ação bacteriana) em compostos simples não agressivos. O bom funcionamento dos biofiltros exige um meio de contato (turfa) para o crescimento da biomassa bacteriana e suficiente suprimento de ar. De fácil manutenção, o biofiltro é indicado apenas para tratamento de baixas vazões de ar contaminado. Este processo é aplicado em produtos biodegradáveis e relativamente solúveis em solução aquosa. A biodegradabilidade de um composto depende das funções químicas que o constituem.
O meio filtrante deve possuir:
• Elevada capacidade de retenção líquida;
• Grande área específica;
• Capacidade de manter alta permeabilidade no decorrer do processo;
• pH neutro e poder tampão para eventuais produtos ácidos;
• Alta porosidade;
• Integridade estrutural.
Colunas de lavagem
O ar contaminado dos exaustores vai para uma coluna de lavagem onde encontra o efluente adicionado em contracorrente.
À medida que o gás sobe pelo meio úmido, é dissolvido e oxidado pelos produtos químicos adicionados ao efluente.
Aplicação de produto químico na rede coletora
Indicado até como prevenção para áreas metropolitanas onde o tempo de detenção dos esgotos na rede coletora é alto, chegando em estado séptico à ETE. São utilizados oxigênio puro, nitrato, peróxido de hidrogênio, cloro, permanganato de potássio, sais metálicos, etc.
Segundo Luduvice Maurício L da Eco Tech System Controle Ambiental, estes tratamentos têm eficiência restrita, porque sua atuação em determinado gás pode não ser a mesma em outro. Os resultados obtidos são parciais ou ainda podem mascarar o odor.
As informações acima foram apresentadas no 19° Congresso Abes, por Luduvice Maurício L. da Eco Tech System Controle Ambiental.
Já para o químico Luiz Carlos da Silva, gerente de produto da Produquímica – Unidade Paulista, diz que são várias as tecnologias utilizadas no combate aos odores provenientes de redes, elevatórias e estações de tratamento de esgoto sanitário. Segundo ele, dois tipos se destacam: o que trata o sulfeto dissolvido ou gás sulfídrico após a geração no meio; e o que previne a formação destes compostos. "Ambas as tecnologias utilizam produtos químicos e também necessitam de equipamentos de monitoramento e medidores de sulfetos em líquidos ou gás sulfídrico na atmosfera para acompanhamento e verificação da performance do tratamento", afirma. Conforme Silva, fazem parte do tratamento e prevenção do odor:
Oxidação – O peróxido de hidrogênio (H202) é o principal produto químico aplicado na oxidação de sulfetos em esgoto sanitário. Entretanto, seu uso deve ser monitorado e controlado devido aos riscos de acidentes envolvidos.
Equação de oxidação
H2S + H2O2 → So + 2 H2O
Sais de ferro – Na introdução de sais metálicos para o controle de sulfeto, o mais usado é uma combinação de ferro II e ferro III.
A reação de precipitação pode provocar o acúmulo de lodos gerados a partir da precipitação de sulfetos metálicos nas redes e elevatórias de esgoto.
Equação de precipitação de sulfetos
Fe+2 + 2 Fe+3 + 4 HS- → Fe3S4 + 4 H+
Nitratos ativados – A medida corretiva é a adição dos nitratos ativados, que funcionam como aceptores de elétrons nas reações de oxidação biológica em detrimento do sulfato, pois a reação é favorecida termodinamicamente. Consequentemente, o sulfato não é reduzido a sulfeto e os problemas de corrosão ou de proliferação de odor não ocorrem.
Equação de prevenção na formação de sulfetos
6NO3 + 5CH3OH + Bactérias anaeróbios → 5CO2+ 3N2 + 7H2O + OH-
5 H2S + 8 NO3 → 5 SO42- + 4 N2 + 4 H2O + 2 H+
"A prevenção pode ser realizada por meio de controles na rede coletora de esgoto e em todo o sistema de esgotamento sanitário, como estações elevatórias, interceptores e emissários, evitando-se, além dos maus odores, a corrosão de redes e equipamentos das elevatórias ocasionada pelos mesmos gases odoríficos", enfatiza o engenheiro Fabio de Santi, da Dux Grupo. Segundo ele, a liberação de compostos fétidos na atmosfera por um líquido depende de três fatores: da concentração destes compostos no líquido; da área superficial do líquido exposta à atmosfera; e do grau de turbulência do fluxo deste líquido. Além disso, a liberação depende também do pH do meio: em condições ácidas, sulfetos e ácidos orgânicos são facilmente liberados; em pH alcalino, amônia (NH3) e aminas são favorecidas.
Conforme explica, os maus odores advêm de uma complexa mistura de moléculas com enxofre (H2S gás sulfídrico e mercaptanas, primariamente formadas durante o metabolismo anaeróbio do enxofre); moléculas nitrogenadas (NH3 amônia e aminas, classe de compostos químicos orgânicos nitrogenados derivados do amoníaco); fenóis, aldeídos, álcoois, ácidos orgânicos, etc. Nas ETEs, estes compostos estão presentes em diversos níveis operacionais.
Monitoramento e controle
A Bauminas Ambiental adota uma abordagem mais ampla e completa para o controle dos maus odores. "Nosso princípio é de monitorar quais os níveis de sulfeto de hidrogênio (H2S), seu comportamento ao longo do tempo e identificar suas origens. Somente a partir deste diagnóstico preliminar, é que se define qual a melhor e mais efetiva forma de combater o problema", afirma Marcio Cipriani, gerente da empresa.
Principais pontos de emissão e níveis de concentração dos odores em uma ETE
Os odores podem ser avaliados por meio de técnicas de análises químicas e olfatométricas. "As análises químicas identificam e quantificam os compostos responsáveis pelos odores enquanto a olfatometria qualifica e apresenta as intensidades odorantes com seus níveis de incômodos", explica de Santi. De acordo com ele, os métodos mais utilizados para detecção dos gases causadores de odor são a iodométrica, gravimétrica, volumétrica, cromatografia gasosa/espectrometria de massa. "Os compostos com enxofre possuem seus limites de detecção e percepção olfativos com reduzidas concentrações, sendo, portanto, os principais compostos responsáveis pelos maus odores.
Em segundo grau de importância, apresentam-se os compostos com nitrogênio", esclarece.
Novas tecnologias
Quanto às novas tecnologias, Sena cita a instalação de sistema que promove a reaeração dos esgotos (tal como ocorre em São Francisco, nos EUA), evitando, assim, a geração do sulfeto de hidrogênio. "Geralmente é aplicado em sistemas novos devido à necessidade de alterações estruturais no sistema de coleta de esgotos." Outro processo que tem sido feito no Brasil, segundo ele, é o enclausuramento das unidades que tem maior turbulência e o tratamento do ar contendo sulfeto através de filtro de carvão. Já uma das grandes novidades é o processo que simula o olfato humano, chamado Nariz Eletrônico, analisador de alto desempenho que pode avaliar em tempo real diversos compostos que causam o odor. "São métodos de monitoramento do odor com simulação matemática da dispersão. Com um monitoramento adequado, é possível melhorar o processo de controle de odor, com a aplicação de produtos químicos ou mesmo operando os sistemas de filtros para não ter gastos desnecessários", indica.
A instalação de detectores (Nariz Eletrônico) em pontos de fuga do odor, como por exemplo, uma porta, associada à modelagem de dispersão, dará ao gestor informações fundamentais para se antecipar às reclamações.
Conforme Pavan, da Eco Tech, atualmente existem tecnologias para o controle de odores para os mais variados processos industriais que podem ser aplicadas nas ETEs. A do Plasma a Frio, por exemplo, consiste na captação de ar ambiente, seu posterior aquecimento e passagem pela cabine injetora, composta por células de plasma que transformam o ar aquecido em oxigênio ativo injetado no duto através de um adaptador projetado para promover uma adequada mistura do fluxo gasoso com o oxigênio ativo.
Uma tecnologia recente desenvolvida pela Eco Tech System é o uso do ozônio (O3) como oxidante nos lavadores de gases do tipo torre de enchimento com reação química.
O sistema de tratamento, que remove odores e oxida os poluentes gasosos, é feito por meio de equipamentos geradores de ozônio adaptados ao lavador de gases. Através de sistemas de transferência, é feita a inserção dele em meio líquido e gasoso. O ozônio é um gás obtido a partir do oxigênio existente no ar (uma molécula triatômica e alotrópica de decomposição rápida). Considerado o mais poderoso oxidante e desinfetante natural, é muito utilizado na purificação de água potável, em piscinas de pequeno e grande porte em substituição ao cloro, em caixas d’água, no tratamento de poços artesianos, na piscicultura e em aquários comerciais, em processos de lavagem industrial e na agricultura, entre outras aplicações, afirma Pavan da Eco Tech."
A Fotoionização (FI), segundo Pavan, é outra nova tecnologia no mercado de controle de odor, principalmente na América do Sul, mas usada com sucesso na Alemanha e em outros países da Europa por mais de dez anos. Na maioria das vezes, para tratamento de águas residuais (esgotos), mas também em outras aplicações. Baseada na aplicação de luz ultravioleta (UV) e um catalisador, a primeira parte do processo imita reações naturais que ocorrem na atmosfera superior pela interação do ar e da luz UV proveniente do sol. "Os princípios são bem simples. O ar com odor passa através de uma câmara onde é exposto a uma intensa luz UV, que cria radicais livres que imediatamente começam a oxidar os compostos causadores de odor. Depois, o ar passa por um catalisador onde quaisquer compostos remanescentes são adsorvidos e quebrados pelo fluxo constante dos radicais livres. As reações que ocorrem também indicam atividade catalítica, como um dos subprodutos é o enxofre nativo, a clássica reação catalítica Klaus. Assim, o catalisador atua tanto como um catalisador quanto um tampão", explica.
Já a novidade da Bauminas Ambiental, segundo Cipriani, é o monitoramento em tempo real online dos níveis de H2S como consequência direta na otimização e dosagem de produtos químicos. Enquanto Silva, da Produquímica, diz que o blend de nitratos ativados é a principal tecnologia utilizada atualmente, já sendo aplicada no Brasil há alguns anos. A aplicação de nitratos se sobressai devido à ação preventiva no controle aos odores e corrosão causados por desprendimento de gás sulfídrico em esgoto sanitário. Entretanto, ele aponta os medidores em tempo real como destaque. "A otimização e o acompanhamento via medidores de sulfetos dissolvidos ou gás sulfídrico na atmosfera em tempo real via internet se destacam como importante ferramenta de controle e prevenção de odores e também como registros das emissões gasosas nos principais pontos de geração, ficando à disposição dos gestores e órgão ambiental do Estado correspondente", ressalta.
"A utilização de várias reações químicas ao mesmo tempo, para a redução de odor, é o que existe de mais avançado nessa área. Na qual, a inovação tecnológica está na capacidade em atrair compostos voláteis e transformá-los em compostos inofensivos e inodoros", afirma de Santi. O que existe é o desenvolvimento de produtos com tecnologia de ponta que iniciam uma reação simultânea de vários mecanismos de neutralização: decomposição, absorção (utiliza forças polares e de VanDerWaal), condensação, combinação e interferência (baseada em pares de Zwaardemaker).
Após a identificação do gás ou gases a serem eliminados, de Santi diz que é necessário o projeto para determinar os pontos corretos de aplicação e estabelecer a quantidade certa de produto a ser aplicada e como será o controle do sistema. "Cria-se, assim, uma ‘cortina’ do produto, garantindo que todo o gás produzido seja alcançado", comenta. Por isso, os produtos devem ser acompanhados de sistemas de aplicação, tais como: bicos atomizadores de alta tecnologia, bombas dosadoras de precisão, controles de níveis, etc. Algumas aplicações da Dux Grupo:
Estações completas – Neutralizadores, reagentes e inibidores de odores biológicos para atender às necessidades de controle de odor específicos destes sistemas em torno de tanques, áreas de carga, desidratação e locais de armazenamento.
Tanques/Lagoa – Com biotecnologia desenvolvida para eliminar as moléculas de odor direto na fonte geradora, são produtos que agem sobre as principais atividades bacterianas, melhorando também os níveis químicos e bioquímicos da água.
Tratamento de lodo – Eliminar a geração de odor no armazenamento de resíduos orgânicos com formulações de micronutrientes ativos que reduzem os maus cheiros e reduzem a matéria orgânica em até 50%, proporcionando economia na logística dos resíduos.
Denúncias
Há muitos casos de reclamações e protestos, até no Ministério Público, sobre mau cheiro vindo das estações de tratamento. Segundo Silva, da Produquímica, – com base em Kaye e Jiang (2000) –, mais de 50% das denúncias ambientais feitas pela população aos órgãos de controle ambiental são sobre odores vindos das ETEs. As razões são diversas, entre elas: crescimento da quantidade de habitações vizinhas às ETEs; centralização de unidades de tratamento de esgotos e lodo; e aumento da conscientização ambiental da população. A falta de conscientização de uma parcela das empresas e das ETEs faz com que tenham que arcar com altos custos econômicos, ambientais e sanitários por não atenderem às exigências das leis ambientais. "A questão do odor no Brasil é nova. Agora, estamos na 4ª onda do saneamento, ou seja, o controle de odor. Antes, a preocupação ambiental estava direcionada ao fornecimento de água potável, o que é muito justo e adequado. Depois, voltou-se à coleta e tratamento dos esgotos para evitar doenças. Hoje, nos locais em que as questões de água e esgoto estão equacionadas, a atenção está no odor", explica Sena. Segundo ele, é interessante que, em locais em que não havia coleta de esgotos, não havia reclamação de odor. Com o sistema implantado, este "novo" problema começou a aparecer.
"Na implantação do projeto de sistema de esgotamento sanitário normalmente não há a geração de sulfeto a ponto de causar reclamações. Não apenas no Brasil, mas é comum ao implantar uma elevatória e ETEs, por exemplo, não haver residências próximas, mas, com o aumento populacional, as pessoas começam a ocupar locais próximos a elas. Assim, a percepção do odor é mais evidente e aumentam as reclamações", relata. No Brasil, as medições de odor são subjetivas, não há uma regra objetiva para medir a quantidade de odor. "Somente no Estado do Paraná, foram introduzidos limites com base em Unidades Olfatométricas (UO), muito utilizadas em outros países. Sendo um processo novo para os nossos padrões, é natural que haja a interferência de órgãos de defesa com o objetivo de restabelecer as condições de menor impacto à população", ressalta.
De acordo com Pavan, os investimentos feitos para a implantação das ETEs visam sempre atender às necessidades da comunidade para proporcionar a defesa da saúde e do meio ambiente. "No entanto, em muitos casos, depois do startup do sistema, quando a comunidade se depara com os incômodos causados pelos maus odores gerados no processo, se sente frustrada e aí começam as reclamações envolvendo as agências ambientais, Ministério Público, Organizações Não Governamentais (ONGs) e divulgação na mídia", aponta.
Os incômodos causados têm ocorrido por dois motivos:
• O projeto foi concebido sem a implantação de um sistema eficiente para o controle dos odores;
• O sistema de controle de odores implantado não atendeu à eficiência necessária.
"Também há situações que o sistema de controle de odores implantado inicialmente atendeu às exigências com eficiência, porém, depois de algum tempo apresentou deficiência devido à falta de manutenção e/ou desgastes prematuros dos seus componentes", conta Pavan.
"A conscientização das empresas de saneamento e dos consumidores vem aumentando, uma vez que nós, como sociedade e como clientes destas concessionárias, estamos cada vez mais exigentes sobre nossos direitos. Boa parte dos novos projetos de ETEs já contempla, de alguma forma, um sistema para abatimento ou tratamento de odores, fato inexistente no passado", diz Cipriani.
Para de Santi, o tratamento de esgotos no Brasil tem avançado nos últimos anos, mas o problema das residências ficarem próximas às ETEs ocorre devido à falta de planejamento. Por isso, as queixas têm aumentado. Maior conscientização da população sobre os seus direitos de contribuinte e aumento no número de ETEs, associados às pressões urbanas sobre áreas desocupadas que forçam a construção de residências e/ou centros de lazer cada vez mais próximos das ETEs, têm contribuído para colocar as empresas de saneamento em constante conflito com a comunidade.
Segundo ele, para a população em geral, leiga no assunto, a percepção de bom funcionamento de uma ETE abrange três itens: que a ETE tenha um visual externo agradável; que o efluente final lançado no córrego seja clarificado; e que não se sintam maus odores. Mas tecnicamente, são outros parâmetros que interessam, como a capacidade de redução de: Demanda Biológica de Oxigênio (DBO), fósforo (PT), coliforme fecal (CF), sólido em suspensão (SST), nitrogênio kjeldahl total (NKT), entre outros fatores.
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Necessidade de padrões
Provocar a conscientização das empresas e de ETEs seria uma forma para atender às leis ambientais e resolver a questão do mau cheiro que faz mal às pessoas. "Devido a isso, estamos investindo em campanhas de conscientização e de divulgação do custo-benefício das novas tecnologias existentes", revela Cipriani, da Bauminas Ambiental. Para Sena, da Sabesp, é necessário primeiramente que haja um debate sobre legislação em relação ao odor. "Criar padrões seria o primeiro passo para que as entidades privadas ou estatais se adaptem. Atualmente, por falta de definições claras e objetivas, os novos projetos ficam desguarnecidos", aponta.
"A solução definitiva do problema reside na escolha de tecnologias de tratamento de esgotos que causem menor geração de odor e adoção de leis e normas que exijam que a implantação das ETEs só possa ser aprovada quando cumprir todas as exigências ambientais. Isso inclui ainda o controle dos odores gerados, considerando as responsabilidades das empreiteiras e as penalidades pelo não cumprimento da eficiência e performance definidas em edital", adverte Pavan, da Eco Tech. "Promover a conscientização em todos os níveis da sociedade seria a melhor ferramenta para pressionar as grandes empresas de saneamento no Brasil a adotarem como "danos à saúde pública" a falta de investimentos neste problema tão importante quanto tratar água potável e esgoto sanitário", afirma Silva, da Produquímica.
Mercado
É um grande mercado a ser explorado, mas ainda retraído pela falta de saneamento básico que afeta o setor. A falta de saneamento é o primeiro item a ser enfrentado por esta geração, segundo Sena, para deixar um bom legado às futuras gerações. "Não se pode falar de controle de odor em locais em que não há nem sequer a coleta de esgotos, o que, infelizmente, ocorre em várias partes do Brasil.
É só consultar o Instituto Trata Brasil para ver a situação. O mercado ainda é muito tímido", enfatiza. "Lamentavelmente, o mercado de Sistema de Controle de Odor encontra-se retraído, mesmo com a maioria dos municípios carente de saneamento básico e, consequentemente, de ETEs. Será altamente promissor quando existir uma política eficiente para levar o saneamento básico ao menos para as principais cidades brasileiras, que somam mais de 5 mil municípios", alerta Pavan.
"Devido à grave crise hídrica, as grandes empresas de saneamento no Brasil têm priorizado seus investimentos em buscar, armazenar e tratar água potável para evitar colapsos sociais por causa da falta deste recurso. Entretanto, no ponto de vista social, nossos governantes deveriam manter os investimentos em controle de odores gerados em redes, elevatórias e estações de tratamento de esgoto sanitário para prevenir doenças causadas pela liberação do gás sulfídrico na atmosfera", opina Silva.
Por outro lado, Cipriani vê oportunidades porque, para ele, este é um mercado que vem crescendo nos últimos anos e possui um enorme potencial. "Paradoxalmente, com o aumento no índice de coleta e afastamento de esgotos (redes coletoras e elevatórias) e também no índice de tratamento de esgotos (novas ETEs), os problemas de maus odores também crescem. Daí a necessidade de projetos bem elaborados e a busca pelas melhores soluções disponíveis no mercado", estima.
Segundo de Santi, existe tecnologia e está consolidada a custos viáveis. "A maior resistência em relação à sua aplicação é que, no passado, outros produtos foram oferecidos ao mercado e, simplesmente, eram produtos que, ao serem aplicados, funcionavam como um perfume, mascarando inicialmente o odor, mas, em seguida, o odor forte do gás aparecia. Essa prática ‘queimou’ o mercado", relata. Em função disso, hoje os operadores de ETEs têm resistência na utilização desses produtos inovadores. "Mesmo assim, essa resistência tem diminuído e as empresas de saneamento que utilizam esses produtos estão satisfeitas e as comunidades vizinhas agradecem", afirma.
Contatos das empresas:
Bauminas: www.bauminas.com.br
Dux Grupo: www.duxgrupo.com.br
Eco Tech System: www.ecotechsystem.com.br
Produquímica: www.produquimica.com.br
Sabesp: www.sabesp.com.br