Por meio do sistema de tratamento e reciclo de efluentes, a fábrica da Volkswagen
de Taubaté reutilizou cerca de 3,3 bilhões de litros de água na última década

Desde a realização da Conferência Internacional da Água e do Meio Ambiente, um evento realizado na Irlanda e que antecedeu a Eco 1992 a visão de água como "bem inesgotável" é ultrapassada.
O crescimento demográfico acelerado associado às necessidades produtivas cada vez maiores em todos os setores nos faz pensar sobre as maneiras de usá-la com eficiência. Mudanças climáticas como as descritas no último relatório do IPCC (Intergovernamental Panel on Climate Change) também estão tendo influência sobre os recursos hídricos. No Brasil, neste 2014, índices pluviométricos abaixo dos esperados para o período no estado de São Paulo levaram aos recordes históricos negativos nos níveis do sistema Cantareira.
Dessa forma, a conservação de água potável através da adoção de medidas alternativas com um planejamento adequado da aplicação do recurso nas atividades produtivas é essencial e o reúso surge como boa opção.

Reúso na indústria automobilística
Na indústria automobilística há grande consumo de água quer seja para o processo produtivo ou para uso de seus colaboradores. A água potável é necessária para abastecer os restaurantes, os banheiros e vestiários; a industrial é usada nos processos produtivos, torres de resfriamento e a desmineralizada na geração de vapor e em alguns banhos no tratamento de superfícies da carroceria dos carros.
Durante as etapas básicas da produção do veículo ela também é essencial. "A água é usada especialmente em etapas de pintura das carrocerias, no resfriamento de equipamentos, como compressores de ar e ponteadeiras de solda, e em testes de estanqueidade dos veículos, realizados em 100% dos modelos produzidos pela nossa empresa, para assegurar a qualidade de vedação", ressalta Celso Placeres, diretor de engenharia de manufatura da Volkswagen do Brasil.
Dessa forma, o reúso pode gerar economia, além de contribuir para a preservação do meio ambiente. Seu objetivo centra-se sobre a produção sustentável do negócio, diminuindo o impacto ambiental e reduzindo a utilização de recursos naturais relativos à captação de água. A adoção de tecnologias novas, conscientização dos colaboradores, diminuindo o uso indevido e aumentando a eficiência da reutilização, proporciona a redução dos impactos gerados no descarte dos efluentes e utilização de recursos naturais.

Iniciativas para reciclagem de água nas unidades fabris das principais montadoras
Em fevereiro de 2013 a General Motors do Brasil inaugurou uma das fábricas mais sustentáveis do mundo na cidade de Joinville (Santa Catarina). A unidade foi a primeira a implantar um conjunto de sistemas na área de eficiência energética e proteção ao meio ambiente incluindo a reciclagem de água industrial por meio de osmose reversa e tratamento inédito de efluentes e esgotos por meio de jardins filtrantes.
"O objetivo principal do nosso projeto em Joinville consiste em termos um processo construtivo que respeita o meio-ambiente e, por isso, a nova unidade incorpora um conjunto de sistemas pioneiros nas áreas de eficiência energética e de proteção ao meio ambiente", destacou José Eugenio Pinheiro, vice-presidente de manufatura da GM América do Sul à época da inauguração.
A tecnologia de osmose reversa permite a obtenção de água de excelente qualidade e que pode ser superior à de origem, permitindo aplicação industrial irrestrita, com baixa salinidade e condutividade e isenta de microrganismos. Este sistema possibilita o reúso de até 19.000 m3 por ano o que equivaleria ao consumo de 70 casas populares.
"A osmose reversa é usada para filtrar a água reciclada permitindo sua reutilização seja nos vasos sanitários seja para uso industrial tal como a torre de resfriamento. A fábrica de
Joinville economiza o equivalente a nove piscinas olímpicas - 22,9 milhões de litros por ano. É a primeira aplicação deste tipo em uma instalação automotiva", diz a GM.
Todas as instalações dos sanitários da unidade em Joinville são dotadas de torneiras e descargas de baixo fluxo e com sensor ou temporizador. Também é usado o conhecido sistema de "Wetland" considerado altamente sustentável no tratamento de esgotos por meio de jardins filtrantes e que não utiliza produtos químicos. A metodologia faz uso de plantas para o tratamento e a vegetação é adaptada ao local e integrada à paisagem. Tem baixo consumo de energia, remove 90% dos poluentes e tem uma reduzida geração de resíduos sólidos.
As medidas nesta unidade fabril da GM possibilitaram a recente obtenção do LEED – Leadership in Energy and Environmental Design – na categoria Gold, a mais importante certificação internacional do U.S. Green Building Council.
As grandes e pequenas iniciativas para a redução do consumo de água também dirige a produção da Volkswagen. Uma dessas medidas faz parte da meta mundial "Think Blue.Factory", que visa a redução de 25% no consumo de energia e água e na geração de resíduos, CO2 e solventes, até 2018, em todas as fábricas do grupo. "Utilizando como referência a meta do "Think Blue Factory", que considera os indicadores desde 2010, a empresa reduziu em 13,6% a utilização do insumo. A otimização no consumo de água ocorre a partir de uma base de resultados já bastante consolidada, que mesmo antes de 2010 contava com diversas iniciativas criativas para aumentar a eficiência no uso desse recurso", conta Celso Placeres.
A empresa trabalha em três frentes com relação à água, em suas quatro unidades produtivas: no reaproveitamento, na captação e no investimento em novas tecnologias que reduzam o consumo do recurso.
Dentre as novas tecnologias para maior eficiência e redução do uso de água está a nova pintura da fábrica de Taubaté, onde é produzido o ‘up!’. Fruto de um investimento de R$ 427,8 milhões, a pintura estabelece novos padrões de tecnologia e proteção ambiental, sendo referência na indústria automobilística brasileira. As inovações tornam o processo produtivo ecológico, permitindo reduções de 30% no consumo de energia e de 20% no de água por veículo produzido, em comparação a um processo de pintura convencional.
"A economia de água é realizada por meio de uma tecnologia inovadora, que promove a limpeza dos resíduos de tinta através de um processo eletrostático a seco, que é dez vezes mais eficiente que os sistemas convencionais que usam água. Nesse processo específico, a redução chega a 85% em relação às tecnologias usuais", explica Placeres.
Outro exemplo é a fábrica de motores em São Carlos que conquistou nos últimos doze meses, avanços significativos em preservação dos recursos naturais e consumo consciente. Para a produção da nova geração de motores em alumínio que equipam o up!, Fox BlueMotion e as linhas 2015 da Saveiro Cross e Gol Rallye, foram implementadas novas linhas de usinagem, processo responsável pela transformação da peça bruta em peça acabada. Altamente modernas essas linhas contam com o sistema MQL (Mínima Quantidade de Líquido), em que a necessidade de emulsão oleosa (formada por água e óleo refrigerante), típica dos processos de usinagem, foi drasticamente reduzida. "Esse sistema utiliza em média 50 ml por hora de emulsão oleosa por máquina, o que reduz em oitenta vezes o seu consumo na etapa de usinagem, quando comparado ao sistema usual", detalha Placeres.
A fábrica de motores também implementou diversos projetos para redução do consumo de água sob a coordenação de um comitê interno composto por executivos e empregados de todas as áreas da unidade. A iniciativa que proporcionou maior economia de água consistiu na troca de mais de duzentas torneiras convencionais por torneiras automáticas. A ação gerou uma economia de 2,9 milhões de litros de água por ano.
Em relação ao reaproveitamento, na última década, o tratamento de 100% e reutilização de 30% da água, permitiu o reúso de cerca de 3,3 bilhões de litros de água na fábrica de Taubaté. "A quantidade de água reciclada pela unidade equivale ao consumo de aproximadamente 47.659 pessoas em um ano, considerando o consumo médio de água por habitante na região Sudeste, de 189,7 litros por dia, segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, do Ministério das Cidades. Essa quantidade seria capaz de abastecer por um ano uma cidade como Tremembé (localizada a 12 km de Taubaté), que tem quase 44 mil habitantes", diz Celso Placeres.
Na Anchieta, em São Bernardo do Campo, é realizada uma parceria com a Sabesp, para o fornecimento de água industrial que recicla 840 mil m3 de água por ano, suficientes para encher 224 piscinas olímpicas. Após tratamento dos efluentes industriais, todo o esgoto da fábrica, inclusive o doméstico, é enviado para um coletor específico da Sabesp, que fica conectado à unidade. Esses efluentes são enviados à ETE do ABC, localizado na região de São Caetano do Sul, onde recebe um novo tratamento. A Sabesp, então, retorna esses efluentes a processos industriais da região. Já em São José dos Pinhais, no Paraná, a água utilizada para verificar preventivamente o funcionamento das bombas da rede de incêndio é reutilizada; quase 200 mil litros por semana são reaproveitados para resfriar alguns equipamentos das áreas produtivas, como alicates de solda e solda a laser, na armação, e compressores, no setor de utilidades. Os resultados são significativos para o meio ambiente e para a redução de custos, gerando economia de aproximadamente 10 milhões de litros ao ano. "Nas unidades produtoras de veículos da Volkswagen do Brasil (Anchieta, Taubaté e São José dos Pinhais), 100% dos veículos produzidos passam pelo teste de estanqueidade para assegurar a qualidade da vedação. A água utilizada no teste é filtrada e recirculada para buscar o aproveitamento máximo do recurso. Mas a reutilização de água também é realizada fora dos muros da fábrica. No porto de Paranaguá, onde a Volkswagen do Brasil exporta e importa veículos, há uma ação de reúso de 100% da água utilizada para lavar os carros, que ficam empoeirados por conta dos carregamentos de grãos que passam pelo local. Com a iniciativa, é possível reciclar até 1.000 litros por hora.", complementa Placeres.
Também são usadas medidas para a captação de água. A unidade de São Bernardo desenvolveu um projeto que reaproveita 22 mil litros de água industrial mensalmente, que é utilizada para resfriar os equipamentos do processo industrial. "Durante este processo de resfriamento dos compressores a água fria entra em contato com o equipamento, que está superaquecido, e com o choque térmico a umidade presente no ar muda para o estado líquido, formando pequenas gotas na parte externa do equipamento, que são direcionadas para a caixa de resfriamento e passam por um processo de filtragem para serem novamente utilizadas nos processos industriais. Também há a captação da água condensada do processo de compressão de ar, por meio do qual a água é extraída e filtrada para reúso", explica Placeres.
Nas unidades Anchieta, São Carlos e de São José dos Pinhais, também é realizada a ação de captação de água de chuva, que é utilizada em torres de resfriamento, reduzindo a temperatura das máquinas no processo produtivo. "O processo começa com a captação por meio das calhas do prédio da fábrica. Essa água é filtrada, passa por uma caixa d’água de armazenamento, depois segue para a torre de resfriamento e, a partir desse ponto, é utilizada nas áreas produtivas", conta Celso Placeres.
Em São Carlos, depois de todo esse circuito, a mesma água ainda passa por um processo de drenagem, para manter a concentração ideal de sais minerais, e é novamente aproveitada para a lavagem dos racks que armazenam os motores produzidos pela fábrica. Com o reaproveitamento de água nesses dois processos em São Carlos, a unidade economiza cerca de 1,54 milhão de litros de água por ano.
"Na Anchieta, por exemplo, atualmente cerca de 10% dos 966 mil m2 da área construída da fábrica tem captação de chuva, reutilizada no processo produtivo. A Volkswagen tem investido para aumentar ainda mais as áreas de captação, em todas as suas unidades produtivas", complementa Placeres.
A conscientização dos colaboradores é importante na obtenção de bons resultados e a Volkswagen trabalha neste ponto. "Todas as unidades produtivas possuem Sistema de Gestão Ambiental, certificado pela norma ISO 14001. A conscientização dos colaboradores quanto aos aspectos de sustentabilidade é realizada por meio de constantes divulgações internas em jornal, quadros de aviso (8 passos) e comunicados eletrônicos, enviados por e-mail. Além disso, as fábricas possuem o "Caminho da Sustentabilidade", em que banners instalados em posições estratégicas apresentam aos funcionários e visitantes algumas ações de sustentabilidade e uso racional de água praticadas pela unidade, visando assim conscientizar o maior público possível. Outro fator importante é a presença das comissões internas de conservação de energia e água nas fábricas, as quais são responsáveis por controlar, disseminar, e identificar potenciais de melhoria e economia nos diferentes processos produtivos", detalha Placeres.
Em seu relatório de sustentabilidade a Mercedes-Benz indica as medidas adotadas pela empresa com objetivo de reduzir o consumo de água incluem a instalação de dispositivos redutores de vazão em torneiras e chuveiros; substituição de vasos sanitários e chuveiros; reúso da água utilizada na higienização de alimentos; monitoramento do consumo; e inspeção periódica de equipamentos e instalações para eliminar eventuais desperdícios. Cada unidade da Companhia conta com uma estação de tratamento de efluentes, que possibilita o descarte de acordo com os padrões previstos na legislação. As redes de efluentes são separadas de acordo com a característica do líquido gerado.
A Fiat em sua unidade Fabril de Betim estabelece princípios de Gestão Ambiental e Energética baseados na ISO 14001 e ISO 50001 que inclui a promoção de ações de reúso e reciclagem da água. Em outubro de 2010 inaugurou as novas instalações do complexo de tratamento de efluentes líquidos nesta unidade que ampliou a capacidade de tratamento e permitiu a elevação do recírculo de água na fábrica de 92 para 99% eliminando a captação da água potável da rede pública para uso industrial ao mesmo tempo em que se reduzia o descarte de efluente na rede pública de captação de esgoto.
A Toyota Brasil também vem realizando medidas efetivas no reúso de água tendo ganhado a 9º edição do Prêmio Fiesp de Conservação e Reúso da Água cuja premiação foi realizada no último mês de março. O trabalho vencedor teve como título: Projetos de Redução e Gerenciamento do Consumo de Água nos Processos Produtivos e Não Produtivos da Toyota Brasil e apresentou as medidas que a empresa vem aplicando em três plantas e que incluem a troca do sistema de ultrafiltração de pintura, a eliminação do banho de água deionizada e melhoria no sistema de spray da pintura, a eliminação do transbordo do tanque de armazenamento de água deionizada da pintura, otimização do uso dos sprays nos banhos de pintura, instalação de condutivímero na torre de resfriamento e reutilização na água de pintura. O projeto permitiu a redução do consumo de aproximadamente 41.894,93 m3/ano com o reúso de cerca de 70,4% do volume total e previsão de retorno do investimento em 21 meses.
Pelas iniciativas pode-se observar que o reúso de água tem sido adotado no cotidiano das grandes montadores há algum tempo. Com o crescimento da preocupação da sociedade nas questões relacionadas com a sustentabilidade de forma geral e, mais especificamente, do uso racional da água estas ideias tendem a se consolidar a cada dia nos processos produtivos industriais.

Contato das empresas:
Fiat: www.fiat.com.br
General Motors: www.chevrolet.com.br
Mercedes-Benz: www.mercedes-benz.com.br
Toyota Brasil: www.toyota.com.br
Volkswagen: www.volkswagen.com.br