Investigação Exploratória Da Ozonização De Sedimentos De Lago Urbano

Lagos urbanos podem receber poluentes de fontes pontuais e difusas. Sedimentos de lagos representam o acúmulo de cargas orgânicas de fontes naturais e antropogênicas e complexos metálicos em ambientes aquáticos


Lagos urbanos podem receber poluentes de fontes pontuais e difusas. Sedimentos de lagos representam o acúmulo de cargas orgânicas de fontes naturais e antropogênicas e complexos metálicos em ambientes aquáticos (McDonald et al., 1999). De acordo com Hunt (1998), "há uma necessidade real da avaliação dos níveis de contaminação por metais em sedimentos, de modo a se desenvolver critérios de qualidade para sedimentos. Adicionalmente, a concentração total de metais em sedimentos não permite prever a parcela que é bio-disponível".
A ozonização é um processo tecnicamente excelente para a remoção oxidativa de poluentes químicos e biológicos. O ozônio oxida prontamente contaminantes nas fases sólida, líquida e gasosa; o ozônio gera radicais livres, os melhores agentes oxidantes naturais, ao mesmo tempo em que se decompõe, gerando oxigênio (Langlais et al., 1991). A eficácia do ozônio no tratamento de lamas, sedimentos e lodos já foi mostrada em diversos estudos (Imaoka e Osumi, 1997; Cassidy et al., 2002; Zeng et al., 2000 e 2002; Hong et al., 2008). Adicionalmente, o sistema de geração de ozônio a partir do ar ambiente que foi utilizado nesta investigação é economicamente atrativo.

Coleta de sedimentos
Sedimentos foram coletados do lago 1 do Parque do Ibirapuera, uma área verde com cerca de 1,0 km2 na região sul de São Paulo, assiduamente frequentada por esportistas de todas as idades. O lago 1 recebe cargas pontuais de poluição (principalmente esgoto doméstico) vindas de alguns pequenos córregos, assim como o efluente tratado de uma pequena estação de tratamento de esgotos baseada em flotação, localizada na confluência do lago 1 com o córrego do Sapateiro. Sedimentos do lago 1 foram bombeados para dentro de bombonas de polietileno de alta densidade, considerado não-tóxico e sem risco de contaminar as amostras de sedimentos. O conteúdo de todas as bombonas foi subsequentemente homogeneizado via mistura lenta por alguns minutos, antes da retirada de amostras para determinações analíticas pré e pós-ozonização.

Aplicação de ozônio
Um sistema compacto de aplicação de ozônio a partir de alimentação com ar ambiente foi concebido e construído pela Brasil Ozônio Ltda (www.brasilozonio.com.br). Alíquotas de 25L dos sedimentos homogeneizados foram submetidos a diversos ensaios em batelada, norteados pela definição de uma dosagem e de um tempo de contato. O gerador de ozônio tinha capacidade nominal de geração de 8 g O3/h.
O ar de alimentação era desumidificado e materiais particulados eram removidos antes da entrada no gerador.

Resultado e discussão
A tabela 1 mostra resultados dos ensaios.
A alíquota de sedimento bruto é indicada por (0;0), significando (zero g O3/h; zero minutos de tempo de contato).

 

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A tabela 1 mostra que os valores de DQO tenderam a diminuir ligeiramente e os valores de SFT e SVT tenderam a aumentar ligeiramente com a aplicação de 10 g O3/h; no entanto, todos esses valores diminuíram com a aplicação de 20 g O3/h. O que ocorreu com os valores de sólidos inicialmente deve estar relacionado com a conclusão publicada por Jekel (1994) que ozônio em doses relativamente baixas pode agir como um floculante, incorporando substâncias coloidais em materiais particulados, deste modo aumentando ligeiramente o conteúdo de sólidos totais. Gottschalk et al. (2010) afirmaram que os efeitos de micro-floculação por ozônio podem levar à adsorção de sólidos dissolvidos por sólidos suspensos, deste modo aumentando a quantidade de sólidos suspensos e também o valor de DQO.
A tabela 1 mostra ainda que o aumento das doses de ozônio e do tempo de contato reduziu a concentração de sólidos suspensos.
Os resultados para coliformes fecais sugerem que a dose de ozônio dissolvido foi mais importante para a inativação que o tempo de contato. De fato, aumentando a dose de ozônio de 10 para 20 g/h e aplicando por um longo tempo (60 minutos), fez a eficiência de inativação de coliformes fecais subir de 20,0 para 99,8%. Sólidos suspensos protegem micróbios da desinfecção; de fato, inativação efetiva de coliformes fecais foi obtida quando uma redução significativa dos sólidos sedimentáveis (cerca de 90%) foi atingida. Os resultados para inativação de coliformes totais sugerem que o tempo de contato não teve um efeito tão significativo quanto a dose de ozônio.

Análises de substâncias orgânicas
Uma análise exploratória via cromatografia gasosa com detector de chama induzida (GC-FID) foi conduzida. Os perfis cromatográficos obtidos para uma amostra antes e após ozonização foram comparados com relação ao número e intensidade de picos (vide figura 2). O cromatograma da amostra após ozonização mostra picos bem menores e um número menor de picos do que o cromatograma da amostra bruta - antes da ozonização.

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A tabela 2 apresenta os compostos detectados por cromatografia de gás e espectrometria de massa (GC-MS), em função do tratamento da amostra.
Os resultados na tabela 2 indicam que todos os compostos clorados foram removidos com uma dose de 20 g O3/h no menor tempo de contato praticado de 5 minutos. A remoção de todos os compostos aromáticos detectados foi obtida com a mesma dose, mas com um tempo de contato mais longo (10 minutos).

 

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Um esteróide (DHT) foi detectado na amostra bruta e também na amostra (30;5), porém não-detectado nas amostras com configurações (20;5), (20;10) e (20;20). Uma possível explicação seria a ocorrência de variações de amostra para amostra quanto a concentrações e/ou espécies químicas, independentemente do procedimento de homogeneização prévia (o simples procedimento de mistura dos conteúdos das bombonas), o qual não garante homogeneidade das alíquotas retiradas para os testes.
Todos os ftalatos e siloxanos foram removidos com aplicação de 20 g/h por 20 minutos de tempo de contato.
A tabela 3 lista os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs) e suas concentrações totais por tratamento de ozônio das amostras.
Com relação aos tratamentos com 20 g O3/h, a variação do tempo de contato de 5 a 20 minutos não levou a nenhuma alteração significativa na eficiência global de remoção de HPAs. Com a aplicação de 30 g O3/h, o aumento do tempo de contato de 5 para 10 minutos levou a um aumento da eficiência global de remoção de HPAs de 68,1 para 82,1%. Assim sendo, a importância relativa da dose de ozônio e do tempo de contato na remoção de HPAs não é clara. De todos os tipos de compostos orgânicos encontrados nos sedimentos do lago, os HPAs foram os que requereram a maior massa de ozônio aplicada por unidade de tempo para remoção eficaz.

 

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Análises de metais
Na avaliação da remoção de metais dos sedimentos pela ozonização, uma amostra de sedimentos foi tratada com 20 g O3/h durante 20 minutos. Esse tratamento foi selecionado com base nos resultados de caracterização (tabela 1), que indicaram tal dose como promissora. O tempo de contato de 20 minutos foi adotado como um valor realista e economicamente viável para operações em escala real. A tabela 4 mostra os resultados para a fase líquida dos sedimentos tratados.
A tabela 4 mostra em geral a redução das concentrações de metais dissolvidos e totais (espécies dissolvidas mais espécies metálicas) após ozonização. Algumas eficiências de remoção foram negativas (Mn, Cu e Zn dissolvidos, Sn total). Possíveis explicações: para espécies dissolvidas, a oxidação de complexos metálicos provavelmente liberou algumas espécies iônicas, aumentando a concentração delas em solução; o procedimento de homogeneização das amostras de sedimentos antes da separação de alíquotas para os ensaios não garante um conteúdo "igual" de espécies metálicas em todas as alíquotas. Esta última explicação também se aplica à remoção negativa para Sn total. A tabela 5 mostra os resultados obtidos para a fase sólida dos sedimentos.
Considerando-se as eficiências positivas nas tabelas 4 e 5, as eficiências médias de remoção para metais dissolvidos e metais totais na fase líquida dos sedimentos (ambas em torno de 84%) foram superiores à eficiência média de remoção obtida para a fase sólida dos sedimentos (em torno de 75%).
As partículas, com áreas superficiais relativamente grandes, são coletoras de íons metálicos e normalmente elementos reativos quando do seu transporte do solo para rios e lagos (Stumm e Morgan, 1996) e obviamente exercem uma demanda de ozônio. Assim sendo, acreditamos que a oxidação de metais associados a solos exerce uma demanda de ozônio mais elevada que a oxidação de metais na fase líquida, e este fato por si só pode explicar os valores mais elevados de eficiências médias de remoção obtidas para a fase líquida, em oposição aos obtidos para a fase sólida dos sedimentos.
Os resultados de remoção de metais, tanto de espécies ionizadas como de espécies metálicas, indicaram remoção das fases líquida e sólida dos sedimentos, ao mesmo tempo. Para a conservação de massa de metais, os metais removidos de ambas as fases por oxidação devem ter acumulado no reator. Em outras palavras, após cada tratamento de ozônio completado, amostras do reator eram coletadas do mesmo para dentro de frascos e estes direcionados para análises. As espécies metálicas que reagiram com ozônio (de ambas as fases) devem ter formado espécies metálicas (no caso dos íons) e compostos (p.ex. hidróxidos e óxidos, no caso das espécies metálicas) que se acumularam nas paredes e no fundo do reator, indetectáveis visualmente.

 

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Conclusões
Uma investigação exploratória foi conduzida sobre efeitos da ozonização na remoção de contaminantes orgânicos e inorgânicos e na redução de teores de sólidos suspensos em sedimentos de lagos urbano. A ozonização possibilitou a redução dos teores de sólidos sedimentáveis; quanto maior a dosagem e o tempo de contato, maior a redução, e maior foi a eficiência de inativação de coliformes fecais e totais. Com relação aos contaminantes, uma dose mínima de ozônio para remoção completa de contaminantes orgânicos aparentemente dependeu do tipo de contaminante. Uma influência aparente da especiação de contaminantes inorgânicos (fase líquida versus fase sólida dos sedimentos) na eficiência de remoção dos mesmos foi observada.

 

Investigação Exploratória Da Ozonização De Sedimentos De Lago Urbano
Frederico Lage Filho
Eng. Civil (EPUSP, 1981). M.Sc.(1988), Ph.D. (1992) em Eng. Civil e Ambiental pela Universidade da California-Berkeley. Docente de Pós-Grad., Faculdades Oswaldo Cruz/Programa de Gestão, Perícia e Auditoria Ambiental (2003-atual). Eng. Consultor da Brasil Ozônio Ltda. (2007-atual).

 

Referências bibliográficas:

CASSIDY, D.; HAMPTON, D. E KOHLER, S. – Ozonation and Biodegradation of Persistent Bioaccumulative Toxins in Sediments. In: Proceedings, 1rst International Conference on Remediation of Contaminated Sediments, Venice, Italy, 1-12 de Outubro, 2002.

GOTTSCHALK, C.; LIBRA, J. e SAUPE, A. (Eds.) – Ozonation of Water and Wastewater: A Practical Guide to Understanding Ozone and Its Applications. Wiley-VCH Verlag, 2a ed., 2010.

HONG, P. K.; NAKRA, S.; KAO, C. M. E HAYES, D. F. – Pressure-Assisted Ozonation of PCBs and PAH Contaminated Sediments. Chemosphere 72, 1757-1764, 2008.

HUNT, J.R. – CE 219, Contaminant Transport Processes. Notas de aula, Universidade da Califórnia-Berkeley, Depto. de Eng. Civil e Ambiental,1998.

IMAOKA, T.; OSUMI, H. – Ozonation for the Removal of Organic Pollutants from Sediments in a Cove. J. Water Waste 39 (7), 587-593, 1997.

JEKEL, M. R. – Flocculation Effects of Ozone. Ozone Sci. & Eng. 16, p. 55-66, 1994.

LANGLAIS, B; RECKHOW, D. e BRINK, D. (Eds.) – Ozone in Water Treatment: Application and Engineering. Lewis Publishers, Inc., Chelsea, Michigan, USA, 1991.

McDONALD, R. W,; SHAW, D. P. E GRAY, C. – Contaminants in Lake Sediments and Fish. Environment Canada 31, pp. 23-45, Vancouver, B.C., 1999.

MOORE, J.W. e RAMAMOORTHY, S. – Organic Chemicals in Natural Waters: Applied Monitoring and Impact Assessment. Ed. Springer-Verlag, New York, 1984.

STUMM, W. e MORGAN, J.J. – Aquatic Chemistry, 3a ed., John Wiley & Sons, Inc., 1996.

ZENG, Y.; HONG, P.K. E ANDREW, K. – Remediation of Polycyclic Aromatic Hydrocarbon Contaminated Sediments by Slurry-Phase Ozonation. Em: Proceedings, 93rd Air & Waste Management Association´s Annual Conf., Salt Lake City, Utah, USA, 18-22 de junho, 2000.

ZENG, Y.; HONG, P.K. E ANDREW, K. – Slurry Phase Ozonation for Remediation of Sediments Contaminated by Polycyclic Aromatic Hydrocarbons. Journal of the Air & Waste Management Association, Vol. 52, no.1, 58-68, 2002.
 

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