Uso E Aplicações Dos Sistemas Mbr
Por Carla Legner
Edição Nº 38 - agosto/setembro de 2017 - Ano 7
Diariamente novas tecnologias são apresentadas ao mercado de tratamento de água. A escassez e dificuldade ao acesso aos recursos hídricos despertaram o interesse em criar novos processos e sistemas, visando eficiência, melhor otimização de tempo e espaço
Diariamente novas tecnologias são apresentadas ao mercado de tratamento de água. A escassez e dificuldade ao acesso aos recursos hídricos despertaram o interesse em criar novos processos e sistemas, visando eficiência, melhor otimização de tempo e espaço e redução de custos. Os sistemas que utilizam membranas (MBR), por exemplo, são frutos justamente desse desenvolvimento tecnológico da humanidade.
O sistema MBR (Biorreator a Membranas) é basicamente a integração do sistema biológico convencional (aeróbio) de tratamentos de lodos ativados trabalhando em conjunto com a filtração por membranas. Este processo pode tanto ocorrer em um único tanque, como em tanques separados, nesse caso é utilizado um tanque de aeração biológica e outro tanque de membranas.
Em comparação com um sistema de tratamento de efluente convencional, trata biologicamente o efluente num processo de lodo ativado ou semelhante, e, em seguida, a água tratada é separada do lodo por um decantador, enquanto que em um sistema MBR o lodo é separado da água tratada por meio de uma unidade de membrana.
Marcelo Bueno, gerente regional da Toray do Brasil explica que essa tecnologia foi originalmente desenvolvida para aumentar a eficiência e reduzir o tamanho das estações de tratamento de lodos ativados, por isso o funcionamento é muito parecido com o sistema lodo ativado convencional.
A principal diferença é que no MBR é utilizada uma membrana de Ultrafiltração ou Microfiltração na etapa de clarificação em substituição ao decantador secundário, ou seja, troca-se uma sedimentação à gravidade por uma barreira física reduzindo por completo o escape de sólidos para o efluente tratado. "Com a membrana retendo os sólidos suspensos o biológico pode operar com concentrações de lodo (MLSS) mais altas e com idade mais elevada reduzindo consideravelmente o tamanho do biorreator e aumento a sua eficiência", explica Marcelo.
Qualquer tipo de efluente pode ser tratado pelo sistema MBR, pois este sistema é bastante robusto e versátil, exigindo pouco tratamento primário (a única exigência é o peneiramento prévio do efluente com peneira de 1 a 3 mm). Como este tratamento não deixa de ser um tratamento biológico, o efluente precisa também ter boa biodegradabilidade, ou seja, com relação DBO/DQO em geral acima de 0,3.
É aplicado para tratamento de efluentes contendo material orgânico, o qual é digerido pelas bactérias presentes no reator. De acordo com Joubert Trouvati, engenheiro da GE Water & Process Technologies, as bactérias se desenvolvem no reator devido à manutenção de condições ideais para seu crescimento (oxigênio dissolvido, pH, nutrientes, etc.). Além disso, com uma operação correta, há um balanceamento entre a quantidade de material orgânico alimentado com a quantidade de bactérias disponíveis para fazer esta degradação.
"O sistema MBR substitui, com muitas vantagens, o processo de lodos ativados convencionais. Neste processo, o lodo microbiológico é separado do efluente tratado por sedimentação. No MBR, esta separação é feita através da filtração em membranas de poros muito reduzidos (menores que 1,0 micrômetro), o que produz um efluente tratado de altíssima qualidade. Tal como nos sistemas de lodos ativados convencionais, o MBR pode ser usado também para remoção de nutrientes (Nitrogênio e Fósforo) dos efluentes, com arranjo específicos de configuração do reator biológico", completa Joubert.
Tecnologia e aplicações
De acordo com Daniel Paiva Pavan, gerente de vendas da Kubota, é um processo que vem ganhando mercado recentemente, pois possui duas grandes vantagens: a utilização de muito menos espaço que uma estação convencional e a possibilidade de reutilizar a água tratada, pois a mesma tem excelente qualidade após o tratamento MBR.
A maioria das membranas utilizadas nesses processos são de composição polimérica ("plásticos" especiais) fabricadas com tecnologias proprietárias. Já os polímeros usados como constituintes das membranas mais usuais são: Polisulfona (PS), Polietersulfona (PES) e Fluoreto de Polivinilideno (PVDF). Existem também membranas fabricadas em Polietileno (PE), Polipropileno (PP). O mercado oferece também as membranas cerâmicas, destinadas normalmente a aplicações bastante específicas.
Joubert explica que os fabricantes de membranas investem pesados recursos no desenvolvimento tecnológico e aprimoramento de seus produtos, buscando dentre várias outras, as seguintes características: aumento na capacidade de filtração por área de membrana (fluxo); maior resistência a agentes de limpeza química; maior uniformidade dos poros; maior vida útil; menor custo de produção e facilidade de ampliação de escala.
A tecnologia de membrana separa a água tratada do lodo ativado usando uma barreira física. Esta barreira é permeável e tem uma distribuição de tamanho de poro muito estreita, permitindo a retenção eficiente de bactérias e vírus, juntamente com praticamente todos os sólidos em suspensão, produzindo assim um efluente de alta qualidade.
Além disso, ao não depender da sedimentação de sólidos por gravidade na etapa de separação líquido-sólido, a concentração de sólidos no biorreator não está restrita aos mesmos limites de um sistema convencional, resultando em um biorreator menor, menor área ocupada e outros benefícios. São sistemas altamente automatizados, tornando-os menos susceptíveis a erros humanos e outros problemas em relação aos sistemas convencionais de tratamento de efluente.
A maioria dos sistemas MBR baseia-se em uma configuração de membrana de ultrafiltração de fibra oca submersa, onde a água tratada passa através das membranas e é bombeada para fora usando um sistema de bombeamento a vácuo. Outras configurações de sistema de membrana, como membranas de placa submersas e membranas tubulares externas, às vezes são usadas. Alguns fornecedores de MBR também usam membranas de microfiltração para a etapa de filtração.
De acordo com Ligia C. Rodrigues, gerente de marketing da Koch Membrane, a tecnologia MBR é amplamente aplicada, tanto no segmento municipal como industrial. Ela explica que esses sistemas estão sendo usados por municípios para tratar correntes de resíduos sanitários, de pequenas cidades e complexos residenciais que tratam pequenas vazões de efluente (50 m³/dia) a grandes cidades, tratando (200 mil m³/dia ou mais). No mercado industrial, a tecnologia MBR é amplamente utilizada nas indústrias de alimentos, produtos lácteos, automotivo, petróleo e gás, química e outras.
A Kubota usa a tecnologia MBR em placas planas, as membranas são de polietileno clorado soldadas nas duas faces da placa, com poros de micro ou ultrafiltração, de forma a reter todas as partículas indesejadas (coliformes, bactérias, virus). Como resultado, essa água tratada pode ser utilizada para irrigar áreas verdes, em vasos sanitários (pois não tem cheiro nem cor) ou mesmo pode ser utilizada diretamente para abastecer torres de resfriamento reutilizando a água diretamente, sem passar por nenhum outro tipo de tratamento.
No caso da Toray, a empresa utiliza membranas de ultrafiltração feita em PVDF, que é considerado o polímero mais resistente para este tipo de aplicação com ótima resistência química e física. Já a configuração é a de placa plana submersa o que confere maior robustez além de simplicidade de operação e manutenção para os clientes que optam por MBR.
O sistema não necessita remoção dos módulos ou drenagem do tanque para limpeza química, além de não precisar de sistemas de contra-lavagem e poder operar por filtração à gravidade reduzindo bastante os custos de implantação.
As aplicações são as mais diversas tanto para pequenas quanto para grandes plantas visando tratamento de chorume, efluentes industriais, municipais e reúso. Por sua característica compacta se torna ideal para utilização em embarcações marítimas, plantas montadas em containers para instalação em localidades remotas ou com espaço limitado para sistemas convencionais.
"A eficiência nesse sistema é em função de duas situações, a primeira é por conta da condição específica de operação do reator biológico, onde as concentrações de sólidos no biorreator de um MBR variam entre 8-15 g/l, o que torna o processo de degradação da matéria orgânica mais rápida e eficiente do que sistemas convencionais que trabalham com concentrações mais baixas, entre 3-5 g/l. Além disso a utilização da membrana de ultrafiltração para remoção dos sólidos suspensos confere uma qualidade constante do efluente tratado com turbidez <0,2 NTU e isento de vírus e bactérias", destaca Marcelo.
Etapas do processo
O tratamento com a tecnologia MBR é composto de três etapas. A primeira consiste na peneira fina, onde os sólidos grandes, cabelos, fibras e outros objetos grandes são separados da água que poderiam danificar ou se enroscarem nas membranas. Normalmente utiliza-se uma tela com furos de 2 mm para esta finalidade.
"De acordo com suas características, o efluente pode, adicionalmente, passar por etapas prévias de separação de contaminantes, tais como processos físico-químicos para separação de materiais suspensos e coloidais (sedimentação, flotação a ar dissolvido, separação de gorduras e areia, etc.), o que muitas vezes reduz significativamente a quantidade dos contaminantes, simplifica e diminui o tamanho do reator biológico", destaca Joubert.
A segunda fase é composta pelo tratamento em um reator biológico aeróbio convencional, para degradação de toda a matéria orgânica, redução de DBO, DQO e nitrogênio total, entre outros. A única diferença é que este reator deve trabalhar com concentrações de lodo superiores comparado a sistemas convencionais, em torno de três vezes mais lodo concentrado por volume que em relação a um processo de lodos ativados convencionais.
Ligia explica que a parte do biorreator, normalmente, é dividido por zonas diferentes, para proporcionar as condições ótimas para digestão da matéria orgânica e outros nutrientes. Algumas zonas do biorreator requerem um alto nível de oxigênio para alimentar as bactérias vivas responsáveis pela digestão, enquanto outras exigem um baixo teor de oxigênio para permitir que reações químicas diferentes aconteçam. O oxigênio é introduzido nas diferentes zonas do biorreator por meio de um sistema de sopradores e difusores, conforme necessário no processo.
Por fim, a última etapa consiste na passagem deste lodo pelas membranas de filtração, que por se tratar de uma barreira física, permite garantir a excelente qualidade do efluente tratado. Essa filtração pelas membranas pode ocorrer sem a utilização de bombas, pois a perda de carga na membrana, ou como dizemos a pressão trans membrana (TMP - tans membrane pressure), é extremamente baixa.
A água tratada biologicamente é enviada do biorreator para uma unidade de separação por membrana para clarificar a água tratada e separá-la dos sólidos suspensos do licor misto. O filtrado é removido do sistema para um processo a jusante ou é descartado no ambiente. Processos a jusante comuns incluem osmose inversa, para muitos tipos de sistemas de reúso de água, juntamente com UV ou outras tecnologias de desinfecção.
Existem duas configurações para o sistema de membranas para MBR: membranas pressurizadas e membranas submersas (trabalham a vácuo), sendo estas últimas as mais empregadas. "As membranas em si também possuem diferentes formas construtivas, tais como placa plana, tubulares, fibras ocas, etc. A experiência acumulada ao longo de cerca de três décadas da existência desta tecnologia, bem como as inúmeras referências e aceitação do mercado com vários tipos de efluentes, têm demonstrado uma nítida superioridade para a configuração das membranas do tipo fibras ocas e disposição submersa", completa Joubert.
Para manter as boas condições de processo constante no sistema MBR, o lodo ativado é recirculado a partir do tanque de membranas de volta para o biorreator, e uma pequena corrente de lodo é continuamente ou intermitentemente retirada do biorreator como lodo de descarte. "Em geral, qualquer efluente contendo matéria orgânica e nutrientes pode se beneficiar de uma tecnologia MBR. Além disso, locais sujeitos a regulamentação de qualidade rígida e áreas onde o espaço físico disponível é limitado se beneficiarão do tamanho pequeno e a melhor qualidade do efluente da tecnologia MBR", completa Ligia.
Por que usar sistemas MBR?
A principal vantagem do processo MBR é oferecer um tratamento de efluente mais eficiente e extremamente compacto, proporcionando um tratado de alta qualidade seja para reúso ou para atendimento de legislações restritivas para descarte de efluentes. O espaço físico requerido para instalação de um MBR é, muitas vezes, metade do espaço requerido por uma tecnologia convencional como Lodos Ativados. Além disso, a qualidade do efluente tratado, com baixo teor de SST e turbidez, é muito superior e possibilita o reúso direto dessa água para fins industriais ou fins não potáveis.
Quando o cliente possui pouco espaço disponível, o MBR pode tratar o mesmo volume de efluentes em uma área, ao redor, 3 vezes menor, pois a concentração dos lodos dentro dos tanques é proporcionalmente 3 vezes maior. Isto permite também que uma planta de tratamento aeróbio convencional que necessite ser ampliada (por conta de uma maior vazão ou de uma maior carga orgânica), possa fazer essa ampliação apenas com a instalação dos módulos de membranas dentro dos tanques existentes, sem a necessidade de aumento de tanques, obras civis, etc. Muitas vezes, isso é inclusive mais barato do que ampliar uma planta usando tratamento convencional.
A possibilidade de reutilizar a água tratada é outra grande vantagem, pois a barreira física que é a membrana garante excelente qualidade após o tratamento MBR. Destaca-se também a estabilidade do processo e facilidade de ampliação de capacidade. "O desenvolvimento dessa tecnologia começou há muitas décadas, e vem se desenvolvendo e aprimorando ao longo do tempo, principalmente em países que detêm domínio desta tecnologia como o Japão. A ampla experiência de empresas como a Kubota contribui para isso, pois tem um conhecimento muito apurado nesta tecnologia", enfatiza Daniel.
De acordo com Joubert a eficiência da tecnologia MBR advém da filtração promovida pelas membranas através de poros de reduzido tamanho. Neste caso, as membranas constituem uma barreira física à passagem de sólidos em suspensão, inclusive bactérias e até alguma parcela de vírus. Isto permite que a qualidade do efluente tratado seja praticamente a mesma em qualquer ocasião.
O representante da GE Water, destaca ainda que existem diversas outras vantagens para o uso dos sistemas, como elevada e eficiente remoção de compostos e nutrientes, alto nível de automação e flexibilidade na planta, mas ressalta que alguns cuidados precisam ser levando em consideração. Existem alguns compostos que podem atacar as membranas ou partes existentes de seu sistema, ou ainda causar um entupimento irreversível em seus poros. No caso do efluente em questão conter este tipo de composto e o mesmo não poder ser removido no pré-tratamento ou no reator biológico, então não é recomendável o uso de MBR para este tratamento.
Apesar de requererem menor recurso de mão de obra, os sistemas demandam maior formação e conhecimentos técnicos por parte dos operadores. Joubert cita como outra desvantagem do processo a relação aos sistemas convencionais, os MBRs tendem a consumir maior quantidade de energia elétrica por unidade de volume tratado, ma esta diferença vem sendo bastante reduzida com o desenvolvimento e aprimoramento da tecnologia.
"Uma novidade muito interessante que a GE desenvolveu utilizando membranas chama-se MABR, sigla para Membrane Aerated Bioreactor, ou Biorreator Aerado por Membranas. Nestes sistemas utilizam-se membranas semipermeáveis ao oxigênio, as quais são responsáveis pelo fornecimento de oxigênio à biomassa, que cresce aderida às membranas. Isto promove uma redução enorme no consumo de energia de uma planta de tratamento, uma vez que os custos de energia elétrica para aeração do processo microbiológico geralmente ultrapassam 50% do custo total de energia do sistema", completa Joubert.
"As vantagens do processo MBR é oferecer um tratamento de efluente mais eficiente e extremamente compacto, proporcionando um tratado de alta qualidade seja para reúso ou para atendimento de legislações restritivas para descarte de efluentes. Destaca-se também a estabilidade do processo e facilidade de ampliação de capacidade", ressalta.
Contato das empresas:
GE Water: www.gewater.com
Koch Membrane: www.kochmembrane.com
Kubota: www.kubota-mbr.com
Toray: www.toray.com