Como a tecnologia 4.0 pode ajudar no saneamento
Por Carla Legner
Edição Nº 68 - Agosto/Setembro de 2022 - Ano 12
Nos últimos anos, os avanços tecnológicos e Indústria 4.0 tornaram os processos de produção mais eficientes, autônomos e customizáveis. A inovação permitiu que tudo seja devidamente metrificado e monitorado. A disrupção tecnológica advinda de redes IoT
Nos últimos anos, os avanços tecnológicos e Indústria 4.0 tornaram os processos de produção mais eficientes, autônomos e customizáveis. A inovação permitiu que tudo seja devidamente metrificado e monitorado.
A disrupção tecnológica advinda de redes IoT, smartmeters e toda gama de smartgadgets, voltados para operação e comercial, trouxeram uma infinidade de benefícios para o setor de saneamento no Brasil, como a redução de perdas, acompanhamento das operações, leitura e operação remotas, dentre outros. E com isso, foi possível identificar gargalos nos processos.
“Estamos vivendo um tempo de transformações rápidas por conta da tecnologia. Tudo isso está ligado à comunicação. Ambos nos trouxeram para o online, conectados aqui e agora. A máxima da teoria da evolução sempre foi que os mais fortes sobrevivem, porém, o correto é os mais adaptáveis sobrevivem – enfatiza Luciomar Santos Werneck, presidente da AESabesp.
Para ele, as empresas do setor de saneamento são como quaisquer outras do mundo corporativo e precisam se adaptar para sua sobrevivência. Se antes havia uma visão de que o setor de saneamento não evoluía, com poucos desenvolvimentos e inovações, agora não é mais possível pensar do mesmo jeito, sob o risco de deixar de existir, ou seja, quem não inova fica para trás.
O cliente do setor saneamento também é cliente das telecomunicações e quer respostas rápidas, mas não abre mão da qualidade. É importante ter em mente que estamos conectados em uma rede com o mundo, tudo que as empresas são e fazem é visto por todos, e ela são avaliadas por isso. Desta forma, é necessário ser ágil nas tomadas de decisões, e ter informações confiáveis e tempestivas.
“Os sistemas inteligentes garantem maior previsibilidade no planejamento, ganhos de produtividade, gestão eficiente da manutenção dos ativos, além de uma prestação de serviço com mais qualidade, sustentabilidade e baixo custo” - complementa Bruno Muehlbauer, diretor de desenvolvimento de negócios públicos da Veolia.
Melhorias para o setor
Muito embora se pensasse que o setor do saneamento fosse estático, já faz alguns anos que o mesmo vem passando por incremento de tecnologias e inovações. Segundo Werneck, sempre foi utilizado modelos hidráulicos para projetar sistemas de saneamento, que foram evoluindo nas soluções para dar agilidade e abrangência.
Hoje, já é possível trabalhar em tempo real com ferramentas conectadas em pontos físicos distribuídos por todo o sistema com coleta e transmissão de dados, mostrando seu o comportamento e dos clientes a qualquer momento. Muitos desses modelos, inclusive, são capazes de prever comportamentos futuros e isso permite melhor gerenciamento.
Outra tecnologia que veio para agregar valor ao setor do saneamento é a IoT, internet das coisas. Alguns medidores (hidrômetros) já estão sendo instalados nos pontos dos clientes, com capacidade de coletar diversas informações como pressões e vazões, pelo período de tempo que for necessário: minutos, horas ou dias.
Há ainda unidades de controle de vazão e pressão (UCVP) totalmente automatizadas e transmitindo dados por telemetria, muitas delas nas nuvens. Algumas já estão se adaptando e evoluindo para geração de energia, tornando-se autossustentáveis.
Tecnologias também estão sendo inclusas nas tubulações, em sua forma de fabricação. No monitoramento, tanto nos mananciais quanto dos corpos d’água receptores de efluentes tratados, além da adoção de técnicas e tecnologias que levem ao desenvolvimento da economia circular. Na gestão, com a utilização de centros de monitoramento e salas de tomadas de decisões, incorporados com tecnologias Big Data e Inteligência Artificial, dentre outras.
“Foram adotados medidores inteligentes, com possibilidade de corte integrado e equipamentos de telemetria de baixo custo operacional, possibilitando gerar base de dados robusta para aplicação de algoritmos de inteligência artificial e Machine Learning. A integração destas ferramentas com Business Intelligence possibilita um acompanhamento online e bastante detalhado dos projetos” – complementa Vander dos Santos Dias, gerente de TI da BRK Ambiental.
Nesse caminho, a Veolia Brasil desenvolveu o sistema Sansys, um software de gestão comercial e operacional para saneamento, que é utilizado em mais de 100 municípios do Brasil e também em países da América Latina, como o Peru, para gerenciar atividades referentes ao saneamento municipal de água e, assim, melhorar a eficiência e a gestão do serviço local.
Isso porque, o desperdício ainda é o principal vilão do saneamento. Dias explica que as tecnologias de Smartmetering podem auxiliar diretamente nessa questão, pois além da identificação do consumo online, existem diversos dispositivos como alarmes para mostrar vazamentos internos, possibilitando ao cliente e à concessionária identificarem de forma instantânea quando há esse tipo de evento e resolução de forma rápida e eficiente.
“É possível realizar a gestão dos serviços de água por meio do geoprocessamento integrado de forma integrada ao sistema comercial. Cada recurso SIG pode ser usado por toda a organização de forma simples e a qualquer momento. Ao importar arquivos gráficos de mapeamento, o sistema gera mapas confiáveis e precisos” – ressalta Muehlbauer.
Ainda segundo ele, o módulo de SIG está totalmente integrado ao cadastro comercial, sendo possível ainda calcular perdas de maneira simples e rápida, comparando o consumo micro com o macro medido de regiões específicas e, desta forma, proporcionar acesso a poderosas ferramentas de gestão.
É possível ainda emitir relatórios personalizados, acompanhar cada operação através de dashboards por contexto, personaliza-los e criar indicadores gerenciais e semáforos com as metas estabelecidas para as equipes. São ferramentas que trazem inteligência à gestão do negócio.
Além do combate a perdas, os sistemas inteligentes permitem outras funcionalidades, como o controle remoto de fluxo e pressão da água nas redes de distribuição. O direcionamento dinâmico no sistema de distribuição permite a garantia do abastecimento em regiões que apresentam maior demanda em cada período do dia, bem como preservar as pressões em patamares adequados nos períodos de menor consumo.
Para o consumidor também há funcionalidades, como o acesso às informações sobre o serviço. Muehlbauer conta que por meio de ferramentas planejadas e estruturadas, garante-se a transparência e o atendimento a qualquer tipo de solicitação. A principal característica dessas funcionalidades é possibilitar o atendimento de forma ágil e eficiente, sendo ainda constantemente aperfeiçoadas para adequação às necessidades específicas de cada contexto.
“Existem ainda sistema capazes de fazer toda a gestão de uma estação de tratamento de água, analisando a água em várias fases do processo e determinando e dosando as quantidades de produtos químicos necessários para a potabilidade da água a ser distribuída” – afirma o presidente da AESabesp
Automação
A automação no setor já é completamente difundida e quase que obrigatória para obtenção de uma operação de fato eficiente. Além das unidades de tratamento de água e esgoto sanitário, a automação dos sistemas de distribuição e coleta estão cada vez mais disponíveis e em constante evolução.
Não se limita mais apenas aos equipamentos de maior porte como motores de estações elevatórias e válvulas de grandes adutoras, estando disponível também para pequenos sistemas e até mesmo para as ligações individuais, possibilitando a realização de cortes de forma remota no fornecimento de água às unidades consumidoras.
“Na Veolia, por exemplo, além das soluções de automação instaladas nas infraestruturas, o centro de controle ou Hubgrade permite ainda a programação segundo uma lógica pré-estabelecida, a atuação remota e o monitoramento constante de toda a operação” – conta Muehlbauer.
No caso da BRK, a empresa conta com uma série de medidores inteligentes e sistemas de predição, atuando de maneira pioneira no mercado de saneamento. Podemos citar como exemplo, os medidores inteligentes instalados em grandes consumidores, além dos diversos testes com equipamentos de ponta para micromedição e operação comercial nas Unidades de Negócio.
Segundo Dias, o processo de automação integra as diversas variáveis obtidas com a instrumentação e equipamentos do processo, que possibilita o funcionamento, monitoramento e controle dos Sistemas de Água e Esgoto. Isto é feito através dos CLPs (Controladores Lógicos Programáveis), das UTRs (Unidades Terminais Remotas), das IHMs (Interfaces Homem-Máquina), de um sistema de comunicação (telemetria) e um CCO (Centro de Controle Operacional).
Neste processo encontram-se os Sistemas SCADA (Supervisory Control And Data Acquisition), que é composto por aplicativos (softwares) que permitem receber, analisar, armazenar, controlar e apresentar aos operadores do CCO, de maneira amigável através de computadores PC, o estado dos dados do processo e dos equipamentos de campo.
Por meio dessa ferramenta é possível executar diversas tarefas sobre uma determinada planta ou em um sistema de Água ou Esgoto. Além disso, também possibilita apresentar e classificar alarmes do processo, registrar históricos de eventos, realizar estudos de tendência, dentre outras funcionalidades. Além de disponibilizar vários níveis de controle, como operação automática, manual remota e manual local.
Vale ressaltar que os sistemas de automação e telemetria do saneamento normalmente são dotados de CCO’s e estações remotas. Todo processo é executado em conjunto com a equipe de Cyber Segurança, de modo a reforçar a segurança contra-ataques cibernéticos.
Através de todo esse monitoramento é possível controlar com alta eficácia uma série de problemas relativos às redes de distribuição, não se limitando à gestão de vazamentos, mas possibilitando também a detecção de fraudes e falhas na medição, que originam as perdas de faturamento.
Existe também a possibilidade de executar de forma mais rápida e simples os processos inerentes à operação dos sistemas, sem a necessidade de conhecimentos técnicos específicos, além da parametrização para atualização de regras e procedimentos de negócio.
Tecnologia 4.0 e o Meio Ambiente
Quando tratamos de gestão de perdas estamos pensando em sustentabilidade, ou seja, ao monitorar os corpos d’água, há o cuidando e atenção com o meio ambiente. Inclusive, a tecnologia 4.0 pode também ser usada em processos de tratamento de esgotos, semelhante ao tratamento de água, fazendo gestão das fases do tratamento.
Ela permite o uso mais eficiente de recursos como energia, água e insumos. A modernização dos modelos industriais proporciona que o consumo destes recursos seja feito de forma mais eficiente e sustentável. “Como resultado temos a redução de custos, redução do impacto ambiental no ciclo de vida total do serviço, aumento da produtividade e da competitividade. Uma forte correlação entre os temas Indústria 4.0, inovação aberta e sustentabilidade” – enfatiza Muehlbauer.
Nesse sentido, nas captações e estações de tratamento, a BRK Ambiental utiliza sensores digitais para monitorar de forma on-line os parâmetros críticos da qualidade da água. Com este monitoramento é possível ter os dados relativos à qualidade da água bruta e durante o processo de tratamento, em tempo real. Isto facilita e otimiza as decisões operacionais, inclusive quanto a parâmetros de tratabilidade da água.
Além dos dados provenientes do monitoramento online, os laboratórios que realizam o monitoramento da qualidade de águas e efluentes são integrados por meio de um sistema LIMS (Laboratory Information Management System). O LIMS, com sua base de dados consolidada e diversas integrações realizadas (PI system, sistemas do Ministério da Saúde e laboratórios), possui uma versão 100% on cloud, proporcionando maior segurança cibernética das informações.
Por fim, a inserção dos dados de qualidade da água é automatizada e digital no sistema de informação de vigilância da qualidade da água para consumo humano do Ministério da Saúde, o SISAGUA.
“A tecnologia 4.0 é uma grande aliada às questões de qualidade e excelência operacional, propondo integrações entre sistemas e desenvolvendo aplicativos e dashboards para acompanhamento de indicadores operacionais. Em alinhamento com as melhores práticas ESG e caminhando para o paperless nas suas operações, é possível evoluir sem perder a rastreabilidade de resultados, ganhando agilidade, confiabilidade da informação e maior assertividade nas ações operacionais” – ressalta Dias
E quando o assunto é mercado, o diretor da Veolia destaca que há uma forte expectativa de crescimento para os próximos anos, sendo o setor de saneamento um forte candidato a liderar os investimentos em infraestrutura no país. “O contínuo amadurecimento das diretrizes estabelecidas na Lei 14.026/20 está proporcionando maior segurança jurídica e estímulo ao investimento privado, criando as bases que possibilitam o desenvolvimento pleno não só da universalização, mas também das melhorias nos níveis de serviço que tanto são necessárias” – afirma.
Essas melhorias do setor se apoiarão em grande parte nos fundamentos do Saneamento 4.0. Os investimentos, mais do que possibilitar, demandam novos padrões de eficiência na prestação de serviço com inserção das novas tecnologias hoje disponíveis. A presença cada vez maior da IoT (internet das coisas) e IA (inteligência artificial) nas soluções para o saneamento já são realidade e devem crescer continuamente.
“Muito falamos em transformação digital, inteligência artificial e tecnologia 4.0, mas é essencial compreender que tudo isso passa por uma mudança de mentalidade e que envolve o comportamento humano, que deverá operar, analisar e tomar as decisões. Ao final de tudo está o profissional do saneamento, que necessita ser valorizado. Não se faz saneamento sem uma grande bagagem do capital humano” – finaliza Werneck.
Contato das empresas
AESabesp: www.aesabesp.org.br
BRK Ambiental: www.brkambiental.com.br
Veolia: www.veolia.com/latamib/pt