Hidrogênio verde tem figurado na mídia como uma bala de prata para a descarbonização da economia global

Talvez o hidrogênio verde não se comporte apenas como mais um hype, mas, este tema certamente ainda terá muitos desafios pela frente


* Por Milton Rego, Presidente da Abiclor

O hidrogênio verde tem figurado na mídia como uma bala de prata para a descarbonização da economia global e, nas últimas semanas, vimos o Governo começar a semear o que, quem sabe a médio prazo, pode originar um marco legal para exploração de hidrogênio de baixo carbono. Mas será que, por ser uma alternativa descarbonizar uma série de segmentos, especialmente como fonte energética, ele realmente tem potencial para solucionar os impasses da eletrificação no Brasil, em especial na indústria e no setor de transportes?

Talvez o hidrogênio verde não se comporte apenas como mais um hype, mas, este tema certamente ainda terá muitos desafios pela frente, entre eles, conciliar os interesses de todos os que estão de olho nele como ’a bola da vez’. Alguns dizem ser necessário garantir que os futuros produtores de hidrogênio verde tenham acesso a benefícios competitivos, sendo a exportação uma das principais alternativas. Porém, se o propósito é descarbonizar, produzir e ter como destino outros países, a “novidade” não se difundirá positivamente dentro do nosso país, pois só as empresas produtoras sairão ganhando. 

Precisamos nos posicionar de uma maneira mais estratégica, uma vez que possuímos grandes vantagens na produção de energia renovável - condição indispensável para a produção de hidrogênio de baixo carbono. Temos também reservas de gás natural e uma agroindústria extremamente desenvolvida, condições que possibilitam o avanço de diferentes rotas de produção de hidrogênio sustentável.

Outro ponto de atenção em relação ao H2V é o fato de ser um gás extremamente leve e muito vulnerável à combustão. É imprescindível investir em pesquisas para que seja manejado e transportado de maneira segura. O setor químico de cloro-álcalis, por exemplo, produz hidrogênio há mais de 90 anos, mas, em virtude da sua complexidade logística, o principal destino é o uso cativo, o consumo próprio. Para ser transportado, independentemente do destino, convém estudar a viabilidade de construir “building blocks”, ou seja, soluções que favoreçam a cadeia como um todo. Entre todas as possibilidades, o desenvolvimento da utilização de uma rede de gasodutos parece ser a mais promissora.   

Ao avaliar projetos de lei, o Governo deve contemplar elementos que possibilitem o seu transporte para que venha a ser utilizado pela indústria nacional. Isso significa desenvolver sistemas e produtos que sustentem uma demanda recorrente, ancorada num arcabouço regulatório adequado à realidade brasileira e que fomente um uso estratégico e tecnológico dessa matéria prima.

Destaco também a relevância de desenvolver uma certificação para que a indústria que utilize essa matriz energética tenha um diferencial competitivo realmente sustentável - inclusive ao exportar produtos finais. Caso contrário, vamos repetir o que fazemos hoje com a nossa produção de café, em que exportamos grãos e importamos cápsulas!  

O desenvolvimento do hidrogênio sustentável em larga escala no Brasil só faz sentido se for percebido como uma oportunidade para descarbonizar a economia e finalmente alavancar a neo-industrialização do país. Agora, se a aposta for pelo mercado externo, isso não deve resultar em mais custos que impactem o fornecimento de energia para a indústria brasileira. 

O hidrogênio verde ainda é embrionário. Há um longo caminho a ser percorrido, quiçá uns cinco anos, mas tomara que irradie novos investimentos para a economia do nosso país, em especial, para a indústria química. Estamos mergulhados num déficit muito grande de complexidade produtiva, então, se não explorarmos bem essa oportunidade de crescimento que o Brasil possui, iremos perder, mais uma vez, o bonde da industrialização.

 * Milton Rego é Presidente-Executivo da Abiclor (Associação Brasileira da Indústria de Álcalis, Cloro e Derivados) e da Clorosur (Associação Latinoamericana da Indústria de Álcalis, Cloro e Derivados). Engenheiro mecânico, economista e especialista em gestão, o executivo acumula mais de 30 anos de atuação na indústria em empresas nacionais e multinacionais. Anteriormente foi presidente-executivo da Associação Brasileira do Alumínio (ABAL), diretor de Comunicação Corporativa e de Relações Externas da CNH Industrial, empresa de bens de capital do Grupo Fiat. Exerceu também as vice-presidências da Anfavea, da Câmara Setorial de Máquinas Rodoviárias da Abimaq e da ABAG. Mais informações em https://www.linkedin.com/in/milton-rego-8b78a015/ 

Jimena Carro <jimena@hercogcomunicacao.com.br>

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