O lixo que pode abastecer o futuro

Transformar resíduos em combustível sustentável é um ativo que pode ser usado em nosso benefício, diz especialista


No dia 26 de janeiro é celebrado o Dia Mundial da Educação Ambiental, um marco que reforça a importância de práticas conscientes para preservar o planeta. Neste contexto, a gestão sustentável dos resíduos gerados pelas atividades domésticas, comerciais e industriais assume um papel crucial, uma oportunidade valiosa para transformar rejeitos não-recicláveis em energia limpa.

Para se ter uma ideia, cada brasileiro produz em média um quilo de resíduos sólidos urbanos por dia. São bandejas de plástico, papéis engordurados, esponja de cozinha, isopor, embalagem metalizada e de produtos congelados, etiquetas adesivas, colchões, sofás e até fotografias, entre outros. Segundo a Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (ABREMA), esse volume é suficiente para encher 2.000 Maracanãs.  

A gestão de resíduos é um desafio para a sociedade, mas também uma oportunidade para transformar lixo em solução Segundo o Painel de Resíduos Sólidos produzido pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), são gerados mais de 700 milhões de toneladas de resíduos industriais por ano no Brasil. De acordo com a ABREMA, 41,5% dos resíduos sólidos gerados nas cidades brasileiras ainda têm destinação inadequada, sendo que 35,5% vão parar em aterros não controlados, os chamados lixões, e 5,7% são queimados no local de geração sem controle ambiental nem licenciamento. Tudo isso representa uma grande ameaça ao meio ambiente e à saúde pública.  

Dentre as destinações sustentáveis, alternativas como reciclagem, compostagem e coprocessamento ainda são muito tímidas no Brasil, totalizando apenas 8,5% de todo resíduo sólido urbano. 

“O aproveitamento dos resíduos não-recicláveis para a produção de energia limpa é fundamental para cumprir o Plano Nacional de Resíduos Sólidos e tem um potencial de figurar como uma destinação muito mais relevante. Os grandes geradores, sejam entes públicos ou privados, desempenham um papel crucial nesse processo e tem a oportunidade de adotar medidas para integrar práticas sustentáveis às suas políticas de gestão de resíduos. Fazendo isso não só beneficiarão o planeta, mas criarão um círculo virtuoso de produção”, afirma Eduardo Porciúncula, gerente geral da Verdera, unidade de gestão e destinação sustentável de resíduos da Votorantim Cimentos. 

Do lixo à energia: a transformação dos rejeitos não-recicláveis 

Resíduos não-recicláveis, como plásticos e papelão contaminados, podem ser transformados em CDR – Combustível Derivado de Resíduos, uma alternativa limpa ao uso de combustíveis fósseis em indústrias de cimento e outros setores intensivos em energia. Na Verdera, por exemplo, restos de plásticos, embalagens flexíveis, EPIs, papéis e tecidos contaminados que não podem ser reciclados compõem os insumos para a produção do CDR, contribuindo para a economia circular. 

A conexão entre educação ambiental e inovação 

No Dia Mundial da Educação Ambiental, iniciativas de conscientização ganham destaque e o debate sobre o destino correto dos resíduos torna-se ainda mais relevante. Para Eduardo Porciúncula, a educação é um pilar fundamental na transformação do setor. “Precisamos investir em programas que incentivem as empresas a adotarem modelos sustentáveis de descarte.  Hoje, temos uma legislação robusta, que favorece destinações sustentáveis. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) estabelece uma ordem de prioridade para destinações de resíduos, na qual a disposição final em aterros sanitários é a última alternativa, após esgotada outras soluções. O Plano Nacional de Resíduos Sólidos também estabelece metas de reaproveitamento dos resíduos sólidos, mas ainda temos um desafio enorme para tirar essas regras do papel. Só assim será possível criar uma cadeia de valor que beneficie toda a sociedade”, afirma. 

Além da educação, eventos globais como a COP 30, que será realizada em Belém no final deste ano, colocam o Brasil no centro do debate climático. A busca por energia limpa e sustentável será um dos principais temas do encontro, refletindo o compromisso mundial com a redução das emissões e a proteção dos recursos naturais. 

A energia limpa como motor de um futuro sustentável 

A transição energética é uma prioridade global para mitigar os impactos das mudanças climáticas. No Brasil, que possui uma matriz energética majoritariamente renovável, o CDR oferece soluções complementares para reduzir a dependência de combustíveis fósseis e ampliar a sustentabilidade do setor industrial. 

A utilização do CDR como combustível alternativo já apresenta crescimento expressivo, com potencial para reduzir em até 70% as emissões de CO2 nas indústrias que o adotam. 

O papel das corporações na transformação ambiental 

O cumprimento das metas do Plano Nacional de Resíduos Sólidos e dos compromissos internacionais depende da atuação conjunta de governos, empresas e cidadãos. As corporações têm escala e potencial para destinarem recursos para impulsionar mudanças significativas. Investir em tecnologias que transformem resíduos em energia não apenas promove a sustentabilidade, mas também representa uma vantagem competitiva no mercado. 

Com o Dia Mundial da Educação Ambiental reforçando a importância da conscientização e a COP 30 trazendo o Brasil para o centro das discussões climáticas, 2025 apresenta-se como um ano decisivo para avanços em energia limpa e gestão de resíduos. O lixo, muitas vezes descartado sem valorização em aterros sanitários, tem o potencial de abastecer cidades inteiras, demonstrando que as soluções para um futuro mais verde já estão ao nosso alcance. 

Marina Capistrano (marina@nqm.com.br)    

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