Da gestão de resíduos à economia sustentável: a nova Lei nº 15.088
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Dados divulgados em 2023 pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema) indicam que o Brasil conta com mais de 3 mil lixões em operação
Por Flávio Linquevis*, advogado e mestre em Legislação Ambiental
A promulgação da Lei nº 15.088, em 7 de janeiro de 2025, que altera a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010), é um passo largo para a expansão da temática de sustentabilidade em território nacional. Ao proibir a importação de resíduos sólidos e rejeitos – com exceções rigorosamente estabelecidas –, a nova legislação busca fortalecer a economia circular e evitar a sobrecarga dos já críticos sistemas de gerenciamento de resíduos no país.
Dados divulgados em 2023 pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema) indicam que o Brasil conta com mais de 3 mil lixões em operação, mesmo após as determinações legais para a extinção. No mesmo ano, um levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) constatou que 31,9% dos municípios brasileiros ainda utilizam lixões como unidade de disposição final de resíduos sólidos.
Com a evidente dificuldade para implementar a disposição final ambientalmente adequada dos resquícios, sobretudo nos prazos previstos pelo artigo 54 da Política Nacional de Resíduos Sólidos, os riscos à saúde pública e à contaminação de solos, águas e ar característicos das formas nocivas de manejo dos rejeitos permanecem. Mais do que isso, tais riscos podiam - até então - ser amplificados com a importação de resíduos estrangeiros.
Nesse contexto, a nova lei se destaca. A legislação anterior já impunha restrições à importação de resíduos sólidos perigosos que causassem danos ao meio ambiente e à saúde pública e animal, mas a Lei nº 15.088 as ampliou, abrangendo materiais como papel, plástico, vidro e metal. Com isso, o Brasil se movimentou de forma significativa para proteger o território da entrada de resíduos estrangeiros, eliminando um fator agravante para a situação dos lixões e aterros inadequados que ainda existem em várias regiões.
É importante destacar que a nova legislação prevê exceções à regra da proibição. O artigo 49 da Lei nº 12.305/2010 foi alterado para permitir, por exemplo, a importação de resíduos que serão utilizados na transformação de materiais e minerais estratégicos – como aparas de papel de fibra longa e resíduos metálicos –, bem como a importação para logística reversa e reciclagem integral de produtos nacionais exportados anteriormente, no caso de autopeças (exceto pneus).
Essas exceções são fundamentais para que a entrada de detritos do exterior se dê apenas em contextos que tragam benefícios concretos ao país, evitando que a medida seja instrumentalizada para aumentar o fluxo de materiais de risco e garantindo a manutenção do desenvolvimento de setores da economia que podem se beneficiar da reciclagem.
No entanto, para que as exceções não se convertam em brechas que coloquem em xeque os objetivos ambientais da lei, é imperativo que haja regulamentação rigorosa e mecanismos de fiscalização eficazes. A experiência internacional e os desafios vivenciados por diversas cidades brasileiras demonstram que a gestão inadequada é um problema sistêmico que exige políticas públicas consistentes e infraestrutura adequada, não deixando espaço para descuidos.
A proibição da importação de rejeitos é, de fato, um passo importante rumo à proteção ambiental e à promoção de uma economia mais sustentável. Mas é fundamental que essa medida não seja a única. Ela precisa caminhar de mãos dadas com investimentos em tecnologias de reciclagem, ampliação da coleta seletiva e reabilitação de áreas contaminadas, assim como deve servir de inspiração para outras políticas públicas que somem na luta jurídica por um futuro amigável ao meio ambiente. Só assim será real a transformação de um cenário de degradação ambiental em oportunidades para inovação e desenvolvimento.
Pedro Assis (pedro.assis@mention.net.br)